Ser - Ter

Ter / Ser: Apenas verbos.

Ter significa possuir / Ser significa características, qualidade. Se analizarmos a gramática das nossas vidas, notamos a presença constante do conquistado.

Ter - Eu tenho. Sem conquista, sem procura, um só ato: O de Ter.

Pela manhã, ainda pequena, saio do quarto depois de muitos beijos de minha mãe, na tentativa de me acordar feliz.

Na mesa o café prontinho, como eu gosto. Meu pai já saiu para o trabalho e sobre o lugar vago, o jornal do dia.

Sou curiosa.

O rabinho dos meus olhos infantis, passam por sobre às páginas em preto e branco dos anúncios. É um brinquedo novo. Ultima geração, diz o jornal.

- Eu não tenho. Quero um.

Vou para a aula. Minha mãe sai.A aula termina. Volto para casa. Encontro o brinquedo sobre a cama.

Simples, fácil, sem tempo para sonhos ou conquistas. Somente o Ter.

Eu cresço - já sou adulta - Tudo eu tenho. Falta meu pai.

Naquela noite de verão, estou sentada na mesma mesa, rodeada das coisas que gosto. Olho a cadeira vazia. O jornal já não ocupa o mesmo lugar. Esta esquecido na poltrona da sala de estar.

Através da janela aberta vejo o céu.´Bonito, típico do verão e qualhado de estrelas.

Pergunto:

- Onde estão as estrelas que não as vejo?

Minha mãe olha curiosa. No brilho do luar, milhões de pontinhos piscam como vaga- lumes.

Seriam estrelas?

Ela não me contraria. É mais facil concordar.

- Tem razão filha. O céu está lindo mas não tem estrelas.

É nessa hora que ela pensa em sair, vasculhando lojas, bazares, shoppings, para me trazer uma caixa cheia de estrelas e espalhar pelo céu, para que eu possa vê-las com mais clareza.

Estrelas não estão a venda. Eu queria as estrelas.

Me revolto. sou infeliz.

Penso em mim mesma, no que sou e pretendo Ter e não encontro nada.

Ser é diferente.

É o sonho, a queda, a parada, reflexão, descanso para continuar a caminhada até chegar ao sonho.

É a ansiedade da espera e o sabor da conquista.

Penso no passado, no presente e no futuro.

O que tenho feito até aqui?

Grito:

- Eu quero ser, eu sou, eu posso.

Tento voar para a liberdade na tentativa de ser feliz.

Com a mala na mão, olho a casa para manter gravada em minha lembrança, esses ultimos momentos.

Minha mãe na janela, parece bem mais velha e tem os olhos rasos de lágrimas.

Alguns anos se passaram. Voltei. Estou na mesma sala, agora ainda mais vazia e fria.

A tempestade termina, a gotas de água descem pelo vidro. É noite.

Olho para o céu. Escuro,triste, sem lua.

Fecho os olhos.

No meio da noite negra, finalmente consigo ver estrelas.

Thereza Fialho
Enviado por Thereza Fialho em 08/05/2007
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