Pelo prazer da solidão

Saio de casa, tirando depressa o carro da garagem... e nem sei porque, ou para onde vou.

Somente saio, naquela angústia, com a ânsia de sair de casa em um dia frio, não importa pra onde.

Somente quero dar uma volta, quem sabe pensar na vida, ou nos meus amores, ou sei lá, só dirigir por aí, até parar em algum bar, tomar uma cerveja gelada.

Se encontrar algum conhecido, digo que estou com pressa e indo embora... quero o conforto da tristeza.

Quero um toque de solidão.

Penso, por issso preciso ficar só... preciso escrever, preciso ter minhas viagens diárias, ir pra todos os lugares do mundo e ainda estar no mesmo lugar...

Quero ter prazer em tomar banho gelado num dia frio... e ir correndo te abraçar em baixo do cobertor.

Quero buscar fatos na memória, andando só por alguma rua, até que algum pássaro cantando, sentado nos fios grossos dos postes, me tire a concentração e me faça pensar por um instante que eu faço parte de um mundo gigantesco, e que sou apenas uma parte dele.

Quero tocar meu violão, na sacada de casa, baixinho pra não acordar ninguém, e compor uma canção que fale de amor... mas pode ser de guerra também.

Ando pelas ruas mais escuras e acho um bar aberto aonde toca um rock'n'roll antigo. Era Elvis.

Me sento, peço uma cerveja, observo algumas prostitutas passando pela frente do bar (mais uma vez me sinto parte de um mundo gigantesco).

Conto os azulejos brancos e sujos da parede do bar, um cartaz com uma mulher seminua me tira a atenção por uns instantes.

Todos os velhos pinguços do mesmo velho e sujo bar, parecem estranhar a minha presença e cochicham alguma coisa com o dono do bar.

O cochicho parece se tornar mais intenso, apuro os ouvidos e pareço escutar alguém dizendo que deveriam perguntar quem eu era, ou da onde eu era.

Resolvo que já é hora de pagar a cerveja e voltar pra casa...

No caminho da volta me surgem os pensamentos mais loucos, não sei se pelo efeito da cerveja, ou pelo efeito da atmosfera do bar que eu acabara de sair...

Ouço Charlie Parker no toca-fitas, e chego a conversar com ele, sentado on banco do passageiro e conversando "sozinho" abro de volta o portão.

Entro de mansinho pra não fazer barulho, te vejo dormindo, como sempre, linda. Te dou um beijo de leve pra não te acordar, me ajeito ao seu lado, te abraçando, você solta um suspiro e volta a dormir. Fecho meus ollhos também, dessa vez revigorado, sem angústia, ou ânsia, sem precisar da solidão novamente... Pelo menos por alguns dias.

mactire
Enviado por mactire em 10/05/2007
Reeditado em 10/05/2007
Código do texto: T481514