Flashes da Copa


Já me defini como “caçadora de ternurinhas”,como alguém que anda pelas ruas à procura de amenidades,de cenas que possam enfeitar o mundo quase sempre hostil em que vivemos e que possam resgatar o que o ser humano tem de melhor. E, felizmente,sou sempre agraciada com o insólito,com o prosaico que os meus olhos captam e que vai direto para o meu coração.Aí o que foi clicado pelo meu olhar (às vezes tenho minha câmera nas mãos e não perco o registro) bate direto na minha emoção.E enquanto não escrevo a respeito,não sossego.Vou,pois, relatar o que mais me emocionou no jogo Brasil e México ocorrido ontem.

Antes de começar a partida,enquanto aguardava meus amigos,fui para a varanda do restaurante onde me encontrava .Entre uma conversa e outra com algumas pessoas que ali se encontravam,de tempos em tempos esticava o olhar em direção à avenida,que fica não muito distante de minha casa.Essa avenida é passagem obrigatória para quem vem do Mineirão e está hospedado no maior hotel que temos aqui em BH.Dá para imaginar o movimento intenso desses últimos dias.

Logo alguns carros começaram a estacionar em frente ao restaurante onde me encontrava.De dois deles saiu um grupo de homens e mulheres de camisas vermelhas e logo imaginei que eram belgas chegando do jogo do Mineirão.A Bélgica venceu a partida contra a Argélia por 2x1.

O grupo entrou no recinto sem muito entusiasmo,mas dava para perceber que,apesar do comedimento,estavam felizes.Sentaram em frente à televisão,aguardando a hora do jogo do Brasil.

E eu continuava atenta a tudo que ocorria ao meu redor.Olhava para a TV, prestava atenção nos belgas,conversava com meus amigos que já haviam chegado e olhava o entorno também.

De repente ,ouvi a voz de um homem falando bem alto,numa fala um pouco estranha.Voltei-me em direção à pessoa que quase gritava e vi um mendigo,maltrapilho,bem magrinho,cabelos já grisalhos e com um sorrisão estampado na cara.Agucei os ouvido para entender o que ele dizia.É que ele falava um inglês mais para embromation do que outra coisa,mas isso me causou uma boa surpresa.

Mesmo não falando inglês ( a minha imensa timidez não me permitiu a fluência necessária enquanto era estudante),consigo ler e entender muito do que ouço.E pude perceber como o pobre homem conseguiu se comunicar com os belgas.Ele falava sobre a nossa seleção e elogiava também a Bélgica,exaltando o resultado obtido pela seleção belga.Foi o suficiente para um dos homens de camisas vermelhas,sair de sua mesa,ir até o lado de fora do restaurante e entregar uma nota de 100 euros ao pedinte.Ah,ainda bem que estava com a minha câmera em mãos para registrar o momento.O sorriso e os pulos de alegria desse senhor fizeram com que o belga retornasse à sua mesa demonstrando uma alegria maior do que  o momento em que  chegou do Mineirão.

É claro que cliquei esse instante que servirá de ilustração (e comprovação do fato) para o meu texto.

O mendigo ainda falou um pouco mais no seus inglês bem informal e chamou um garçom que foi até ele muito educadamente.Depois de afagar e exibir a nota de 100 euros,ele pediu ao garçom que a trocasse por reais.Quando o garçom,com a nota em mãos,entrou para conversar com o gerente do estabelecimento,eu o chamei até a nossa mesa para comprovar se todas as minhas observações eram verdadeiras ou se a minha emoção me fez ver e ouvir algo a mais ( a minha emoção me prega algumas peças de vez em quando).

O garçom,muito simpático por sinal,e que também falava inglês, mostrou-me a nota de 100 euros (novidade para mim) e me confirmou que o mendigo realmente estava se fazendo entender muito bem em seu inglês e que o mesmo havia pedido 200,00 pelos euros.Nesse momento, me segurei para não fazer uma defesa do mendigo,pois mesmo sem entender de euro,dólar e suas cotações,eu sabia que 100 euros valiam mais do que 200 reais.Sem entrar na polêmica,pois o jogo já estava em andamento,só voltei o olhar mais uma vez para o nosso mendigo bilíngue, ainda em tempo de vê-lo se afastar saltitante com o dinheiro no bolso.

Voltei à cerveja,aos amigos e ao jogo.Aí roí as unhas,gritei,falei algumas tolices por não entender muito de futebol,mas nada que o meu amor à seleção não resolvesse.De vez em quando eu perguntava a um entendido por perto sobre um lance qualquer.

Fim de jogo.Sentimento de frustração no peito.Mas a confiança no sucesso da nossa seleção continua intacto.Ficamos mais um bom tempo por lá.Quando cheguei em casa,antes de ligar a TV para ver e ouvir os comentários abalizados sobre o jogo,me vieram à mente a cara boa ,a brasilidade ,a maneira safa e autêntica de sobreviver do mendigo que chamara a minha atenção.

Isso também é Brasil.É um retrato em miniatura desse país gigante,ainda tão desconhecido dos próprios brasileiros e do mundo.Mas que,depois da Copa,será um pouco mais amado,um pouco mais respeitado lá fora,independentemente de quem seja campeão.

Um evento como a Copa do Mundo é a maior vitrine que um país pode ter para se mostrar aos seus e aos estrangeiros,pois o mundo tem apenas um idioma que se faz entender em qualquer canto,do mais rico ao mais pobre que é o “futebolês”.Seria bom que o pessoal anti-Copa entendesse isso .

E que o humilde brasileiro que ganhou 100 euros de um bondoso belga possa ter tido uma noite mais amena.
amarilia
Enviado por amarilia em 18/06/2014
Reeditado em 19/06/2014
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