O BAR DO CARIOCA

Com Viçosa como destino, pegamos estrada numa quinta à tarde, dia 29 de novembro. Era por volta de 16 horas. Com uma breve parada em Ilicínea chegamos a cidade de São João às 21:50 depois de viagem lenta em estrada cheia. Depois de breve pesquisa encontramos um hotel a preços módicos onde passaríamos a noite pra retomar viagem logo de manhãzinha. Hospedados e de banho tomado saímos pelas históricas ruas da cidade a procura do que comer. Com fome não se dorme.

Depois de rodar sobre as pedrarias e entre o casario colonial encontramos o Bar do Carioca. Fica pertinho da Igreja do Carmo, numa esquina ao lado do cemitério da ordem terceira do Carmo pertencente à confraria de mesmo nome.

O bar se encontrava estabelecido num prédio do inicio do século XX em estilo eclético. Piso de ladrilho paredes pintadas de amarelo e com objetos e quadros que demonstravam que ali havia quem torcesse pelo flamengo. Dentro e fora do bar, o ambiente era composto de mesinhas com forro de plástico estampado, cadeiras, saleiro, paliteiro e porta guardanapos de papel. Dentro não havia freges em oposição ao lado de fora onde comensais a papeavam sob o sereno da noite de novembro e com uma vizinhança silenciosa em seu eterno descanso.

Acomodamos eu José num mesinha na parte de dentro próximo a uma das portas. O ambiente me reportava ao cenário de Quincas Berro D’água. Por algumas frações de minutos viajei em meu mundo interior pelas penumbras ladeiras de Salvador, ambiente desta história de Jorge Amado. Vi até o próprio Quincas no meio de nós. Era um típico botequim onde o requinte e a organização dão lugar ao jeitinho humano e despojado do atendente proprietário.

Quando despertei vi em minha frente um sujeito baixo, com um abada do ultimo carnaval estufado pela barriguinha de chope, bermuda, chinela de dedo, cara redonda com papada a esconder-lhe o queixo e barba por fazer. Era o homem cujo apelido dava nome ao estabelecimento.

Carioca era mesmo um apelido e não um adjetivo pátrio, afinal, descobrimos mais tarde que nascera na Bahia, e depois fez estágio em Rio Branco seguindo para o Rio onde se naturalizou e adquiriu o epíteto de Carioca. Não parando de sapear pelo Brasil morou também em São Paulo onde reproduziu-se, afirmou-nos seu filho presente no bar naquela noite: _Eu nasci em São Paulo. E agora estava em Minas em uma das mais conhecidas cidades do estado, terra de Tancredo Neves.

Após os “boa noites!” veio sem rodeios de braços abertos em nossa direção. Tocou-nos o ombro e com jeitinho de quem quer contar um segredo foi logo sentenciando: _Olha já estamos fechando, mas se for rápido da pra servir alguma coisa.

Argumentamos que nosso desejo era matar a fome e que para tanto podia ser algo rápido. Carioca nos apresentou seu cardápio impresso caseiro em folha sulfite. Com seu dedo gordo mostrou-nos o que não tinha. Depois de sua breve explanação restou-nos apenas a canjiquinha com costela de porco.

Titubeamos quanto a comer a iguaria do carioca ou não. Mas depois de tantos predicados elencados pelo dono do botequim resolvemos arriscar. Vamos pagar pra ver, ou melhor, pra comer. Até porque, nos garantiu o carioca, que se precisasse apontava-nos o caminho do hospital. Enquanto a guloseima não vinha molhávamos a garganta com cerveja observando o cenário do século XVIII que se estendia pela rua afora...

Gleisson Melo
Enviado por Gleisson Melo em 23/06/2014
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