REMÉDIOS DE OUTRORA

Quando eu era criança, achava que alguém com 50 anos era velho, pertinho de morrer. Hoje, prestes a completar 60, eu me acho um “brotinho” e me assusto quando vejo meu rosto no espelho: decididamente, ele é incompatível com minha animação e disposição para ser feliz. Então, fico pensando se realmente os idosos de outrora tinham o pé na cova, e se a juventude atual pensa o mesmo de nós.

Creiam, meninos e meninas, a gente não morreu cedo, porque Deus não quis nos levar mesmo. Já existiam umas doenças bravas chamadas sarampo, varíola, catapora, tétano, caxumba, coqueluche, bronquite, tuberculose... Dessas, as que hoje ainda existem, podem ser contidas com vacinas ou medicamentos, mas, há 50 anos, se elas nos pegassem, para nós virarmos anjos “era daqui para ali”.

Temendo-as, nossas mães nos agasalhavam, proibiam-nos de andar descalços e nos recomendavam lavar as mãos constantemente. Ocorre que a gente desobedecia, porque as ruas não eram calçadas, havia poucos carros, e as brincadeiras normalmente eram piques. Isso nos fazia correr (já imaginou fazer isso usando sapatos?), suar e, consequentemente, ter muita fome. Para saciá-la, bastava invadir alguma chácara urbana, roubar goiabas, mangas e/ou carambolas e ingeri-las sujas mesmo.

Então, repentinamente, um dos dedos dos pés ou das mãos coçava, coçava, coçava e de tanto coçar, descobríamos uma bolinha com um olhinho preto olhando para nós: bicho de pé. Era hora de pegar uma agulha, incandescê-la sobre uma vela para desinfetar e tentar tirar o danado inteirinho, sob pena de ficarmos com o prurido nos atormentando por um longo tempo.

Essa desobediência tinha ainda outra consequência terrível: as lombrigas!! A barriga inchava, doía... Contornávamos ingerindo Atroveran (“Tomou, passou!!”), Elixir Paregórico, Leite de Magnésia de Phillips, Cibalena, mas não tinha jeito: um dia, uma delas, sem mais nem menos, resolvia sair sozinha, em qualquer lugar, na frente de qualquer um, “rachando” a cara da gente de vergonha! O remédio para matá-las era um laxante terrível, chamado Óleo de Rícino, de cujo odor fedido e repugnante eu jamais me esquecerei.

Na verdade, a julgar pelas propagandas de remédios de antigamente, o povo devia padecer não apenas de vermes, mas de fraqueza também. Lembro-me de nomes como, Rhum Creosotado, Vinho Reconstituinte Silva Araújo, Biotônico Fontoura... Lá em casa, acho que mamãe considerava outro muito melhor, pois, de vez em quando, ela fazia a mim e aos meus irmãos engolirmos, na marra, uma colherada generosa de Emulsão de Scott. ARGH!!

Recordo-me de outros nomes de remédios, cujos nomes eu ouvia lá em casa, nas propagandas de rádio ou lia no Almanaque Capivarol: Pílulas de Lucen, Pastilhas Rinsy, Bromil, Regulador Xavier, Água Inglesa, Entero-Viofórmio, Anasseptil, Cafiaspirina, Alka Seltzer (eu achava que o nome era Alcaselsa! KKKKKK....). Alguns tinham nomes que me intrigavam: até hoje estou querendo descobrir qual é o nome da fruta com que faziam o sal da Eno, aquele que "fervia" dentro do copo d'água e cujas bolinhas quase entravam nas nossas narinas.

Hoje, desses remédios citados, poucos sobreviveram, mas quem os ingeriu e consegue ler essa crônica é porque não morreu. Se estiver com a saúde “tinindo” (gíria da década de 70, significando: ótima, perfeita, “nos trinques”) como a minha, talvez se pergunte como eu: a ingestão deles é a explicação para a gente ainda não ter desenvolvido Alzheimer ou é um sintoma da chegada dele? Rs,rs,rs....

NORMA ASTRÉA
Enviado por NORMA ASTRÉA em 13/08/2014
Reeditado em 31/10/2017
Código do texto: T4920883
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