O vôo da andorinha

Na minha infância, eu me perguntava sobre as andorinhas que cruzavam os nossos céus. Assisti inúmeras vezes ao mergulho certeiro de gaviões capturando suas presas em pleno vôo.

Invadido por saudosismo, lembrei que há tempos não vejo uma tesourinha – andorinha com rabo mais longo que o corpo e de graciosidade ímpar. Qual helicópteros, as tesourinhas paravam no ar esperando que as presas lhes chegassem aos bicos abertos.

As andorinhas canadenses surgiram do nada. Não. Nada disso... Só quando elas chegaram, aos milhares, é que foram notadas.

Até pouco tempo atrás, às dezenas de milhares, elas passavam como nuvens sobre o Estado de Roraima. Vindas do Canadá, sempre por volta do mês de dezembro, essas aves atravessam longitudinalmente a América Central e fazem diversas escalas até o seu destino em São Paulo. Com a proximidade do verão no Hemisfério Norte, elas empreendem a viagem de volta ao seu habitat.

Indo ou vindo, elas fazem de dormitório os fios, os postes e as árvores roraimenses.

Esses pássarinhos, durante a longa viagem, devoram milhões pernilongos, mosquitos, brocas, sugadores de cana-de-açucar, vaquinhas-de-feijão, etc. Cada andorinha devora cerca de 2000 dessas presas por dia e praticam o verdadeiro controle biológico de pragas, pois caçam justamente nos meses de postura de ovos. "Esse equilíbrio ecológico faz baixar drasticamente o número de insetos vivos, sobretudo fêmeas dispostas à desova, evitando o perigoso crescimento de larvas e lagartas", explica o ornitólogo americano John Dalgas Frish.

Em 2006, o número de aves migratórias caiu cerca de 90%. De estimados 100 mil, umas 10 mil, somente, chegaram a seu destino no ano passado. Em, 2007 o número de andorinhas também foi insignificante se comparado a 2005. Furacões na América do

Norte e no Caribe foram responsáveis pelo extermínio de milhares destes passarinhos.

Este ano, em Boa Vista, elas escolheram as árvores do Conjunto BNH III, no bairro Mecejana, para descansar. Aos milhares, pousam nos oitizeiros, mangueiras e jambeiros da vizinhança. A revoada é linda e o chilrear é poético.

As ruas do conjunto são batizadas com nomes de pássaros. Será que as andorinhas canadenses escolheram aquelas árvores pensando estar seguras numa vizinhança que homenageia as aves?

Há poucos dias, ao passar na rua Rouxinol, vi a revoada. Localizei os poleiros e planejei voltar para fotografar o retorno das aves ao final da tarde. Na quarta-feira, com câmera em punho, me dirigi àquele endereço. Mas cadê os passarinhos?

De longe vi que um morador do bairro tinha desfolhado os oitizeiros do lugar para não ser incomodado pelo barulho e sujeira provocados pelas andorinhas?

“Oh, falta de amor pelas coisas da natureza! Talvez ele tenha tomado esta decisão porque o canto das pequenas aves o impedissem de ouvir o som emitido pela interessante e educativa programação da televisão brasileira”, pensei.

Nos Estados Unidos, lembra Dalgas, as florestas deram lugar a extensas plantações rasteiras e os passarinhos quase foram extintos ao perder o seu habitat de procriação. “O extermínio destas andorinhas só não aconteceu porque o agricultor norte-americano percebeu o benefício que elas traziam, pois bandos devoravam, diariamente, trilhares de insetos e larvas. Aí, os próprios agricultores começaram a recuperar seu habitat natural e até a instalar em suas propriedades casinhas de alumínio onde as aves pudessem morar e

procriar”, explica o ornitólogo. E conclui: "Logo, logo vamos sentir na pele a conseqüência do aumento dos pernilongos. O fato também terá conseqüências econômicas, pois as plantações vão exigir mais uso de agrotóxicos”.

O barulho e a sujeira deixados pelas andorinhas não duram muito. Por favor, deixem que elas sigam o seu destino em paz!

e-mail: zepinheiro1@ibest.com.br

Aroldo Pinheiro
Enviado por Aroldo Pinheiro em 19/05/2007
Reeditado em 19/05/2007
Código do texto: T493545