COMO É FAZER 64 ANOS!?

COMO É FAZER 64 ANOS

A chuva cai intermitente, ora fina, ora forte, sem ventos e trovões, não prenuncia tempestades. A suavidade da noite já em esplendor pleno da madrugada, à baila de sonhos despertos, ao som imaginário de uma musica que contemporiza pensamentos, emoções e que me faz viajar de volta, e isso é sempre bom, porque, eu revivo a vida repleta de sentimentos e ternas emoções e, nesse momento eu não consigo controlar a velocidade do tempo e o vento... A musica continua, é uma flauta, tocada por um fauno, e agora sou um mágico, posso transformar acontecimentos, estabelecer a plena felicidade e apagar todas as tristezas...

A lua de quarto crescente inclina-se sobre os velhos telhados e já se encontra na linha da maré, enquanto uma enorme bola alaranjada e reluzente emerge do mar, assinalando a perfeição das coisas de Deus. Ouço ao longo um apito estridente de uma locomotiva rasgando a Av Beira Mar, largando faíscas nos trilhos e fazendo um barulho ensurdecedor de ranger de ferros A chaminé expelindo aquela fumaça negra, se misturando com as nuvens baixas de um dia que acaba de nascer... Minha mente vagueia em uma plenitude de acontecimentos e volto à casa paterna e ouço tocar na vitrola a musica Parabéns a Você, vejo o sorriso estampado no rosto de minha mãe me acordando com beijos e abraços, e o velho telefone tocando por pessoas outras que disputam um momento para me desejar Feliz Aniversário. Dessa vez eu mergulhei profundo nas águas azuis do poço da felicidade, então pensei: Como seria bom, se esse tempo jamais findasse se pudéssemos adormecer em sonhos cálidos da juventude, aos acordes da orquestra de um baile interminável e em uma dança trocássemos conversas de salão, aqueles sussurros da noite como testemunha única de um amor verdadeiro... Ah! Quem me dera ter ao menos uma companhia e deixar de ficar esperando pelo sono, para poder ao menos sonhar de ser feliz, e não essa dura realidade de: eu não te tenho e tu não me tens...

Mas, hoje eu queria esquecer navios, carruagens e trens, de telhados e sobrados e tudo o que é velho demais, e com essa juventude que ainda tenho que é o combustível perfeito, para continuar vivendo e sabendo possível ainda te achar... É que a folhinha do calendário vai mudar e eu também, mas que recebo mais essa data com aprendizado louvável na escola da vida, não com a retórica dos dissabores, eu ainda prefiro momentos felizes de todos os meus amores, até mesmo aqueles que deixaram de me amar, ou mesmo, nunca me amaram, eu peço desculpas por não haver conseguido me fazer amar, mas, continuo tentando, até quando?

Eu não sei por quanto tempo eu ainda vou escrever sobre mim, minha vida e amores, eu sinto aquela sensação de que os grãos de areia me escapam às mãos como os anos, ou aquela visão profética da ampulheta findando o tempo, que me tem visitado, sempre que a vida me impõe mais sofrimentos que eu possa suportar. E todas as vezes que isso me acontece me imagino sendo resgatado, de forma carinhosa por uma mão amiga, amorosa, que veja em mim, não apenas um homem velho, mas um ente com virtudes e defeitos, destemido e forte, mas também frágil e carente, e que não pede para ser amado, apenas que aceitem o amor que eu tenho para dar... E assim, eu faço 64 anos.