Meu Olhar Cansado

Desde a hora que acordo até o momento em que me deito ele está lá _ a todo vapor, percebendo as coisas ao meu redor.

Na calmaria observadora de uma pessoa madura, ele aprecia as obras da natureza. Na inconstância típica de um ser inconstante, ele procura por tudo; mas, muitas vezes, não encontra nada. Por quantas vezes meus olhos ficaram vazios diante do que não os interessava, quantas vezes os percebi chorando por motivos que mais tarde eu saberia ser sem sentido?

Meus olhinhos nem sempre sabem a hora certa para se cobrir, porque apesar da imensa claridade do sol, eles têm medo de ficar imerso em escuridão.

Gosto de meus olhos não por sua tonalidade, que pelo que eu saiba não é nada demais. Papai me disse que eles são da cor de burro fugido, mas qual é a cor de burro fugido? Será que não poderia ter, pelo menos, a cor de um burro menos revoltado? Então, eu gosto de meus olhos por tudo de bom que eles já viram e, se a morte, por enquanto, não me pegar (se bem que morrer não é o fim, a alma é eterna e blá, blá, blá) eu penso no que ainda verei... No que poderei reter em minha retina e mandar para a lembrança cenas que me darão motivos para sonhar. É, o mundo, apesar de tudo, ainda nos permite todos os sonhos.

Quando meus olhos se cansam, meu corpo pede abrigo. Mas, minha mente não pára e complica cada vez mais, porque eles a acompanham sempre, principalmente pelo fato de que, por pura teimosia eles teimem que não precisem mais usar “roupa” – meus tão indesejados óculos. O resultado disso é meu rosto com a aparência sempre cansada, que só dá para disfarçar quando estou bem maquiada.

Acho que meus olhos não sabem os direitos que têm. Caso contrário entrariam no “Ministério dos Olhos” e me processariam por excesso de trabalho e pelos muitos e muitos serões. Agora, por exemplo, eles deveriam estar dormindo, mas as idéias vêm e, ao começar a escrever, eu os castigo. Para aumentar minha sentença de culpa, e mostrar que estou sendo covarde, lembro que li na Super Interessante algo que falava a respeito de uma doença chamada Retinoblastoma. Já ouviram falar?

“Mas, que nada!” “... não vou mudar, esse caso não tem solução...”. Sei disso pelo tanto que leio e releio, risco e rabisco, escrevo e me perco. Então, é o brilho do computador fazendo meus olhos cansados lacrimejarem; são os óculos de sol “made in barraqueichon” tornando-os mais pesados; são as horas de sono que perco; são os ciscos que sopro e sopro e que não saem e acabam ficando agarrados na retina por muito tempo; são os filmes, que só assisto se forem legendados; são os livros de Erico Veríssimo que leio (todos com letras pequeninas); etc.

Espero sinceramente que meus olhinhos me entendam. Afinal, de que valeria forçar-me a ler e escrever tantas palavras se mais tarde elas não se transformarem em verso e prosa? De que valeria conviver com tantos espinhos, se não pudermos, depois, saborear as rosas?

Renata Mofati
Enviado por Renata Mofati em 28/05/2007
Reeditado em 29/05/2007
Código do texto: T504258