Marta

Marta

Quando ela nasceu só tinham certeza de duas coisas, que seu nome seria Marta e que alguma coisa muito ruim nascera com a menina, à mãe depois do parto jorrou sangue como um rio, e chorou lagrimas de sangue durante dois dias, entre rezas e poções antes de ficar boa.

De algum jeito a casa entrou em decadência, o telhado a cada chuva perdia um pouco do telhado, as paredes precisavam sempre de reparos porque buracos enormes apareciam de um dia pro outro, onde a menina na sua pequenez passava de um lado a outro rindo muito.

Desde pequena a família percebeu a diferença de mentalidade infantil, Marta no seu pequeno mundo apenas sorria.

Assim a menina que ria muito, linda muito linda, crescia em flor com espinhos invisíveis e mortais.

Aos sete anos começou uma estranha mania de torcer as folhas das arvores até que elas ficassem murchas e quase a cair, mas isso nunca acontecia, de alguma maneira, ela reviviam mais verdes e fortes, os banhos na pedra enorme em frente da casa na beira do rio, também viraram costumes, que a família abominava, mesmo assim Marta se ensaboava e ria.

Com os passar dos anos de tantos banhos e sabonetes, a pedra concebeu um limbo escorregadiu, que virou uma armadilha mortal aos desprevenidos.

Apenas Marta conhecia o segredo do equilíbrio e continuava com seus banhos, ignorando as conversas e controvérsias das suas manias.

Com nove anos, deitada na pedra olhando as nuvens, a mãe se aproxima, gritando que queria ajuda na casa, quando escorregou e caiu no rio caudaloso, no seu desespero levantava os braços pedindo socorro,Marta rindo dizia adeus com as mãos, achando que a mãe era louca de nadar com tanto frio, deu um ultimo tchau e viu a mãe sumir entre a correnteza.

Com doze anos, a casa mal se agüentava em pé. As árvores ficaram estranhas e retorcidas, pequenos animais apareceram não se sabe de onde, Marta ria.

Aos treze anos lagartos enormes cavavam buracos no chão da cozinha para se esquentarem da mata gelada, comiam todos os ovos existentes, e fizeram um banquete quando centenas de pererecas invadiram o quintal em busca de sol, pois a água estranhamente lhes era dolorida na pele.

A família culpava Marta pelas desgraças ocorridas, o tio João que morreu engasgado com o próprio dente no susto de ver lesmas penduradas no teto da casa, a madrinha Zinha que um dia na corria à fugir de um lagarto enorme, pisou no vestido e caiu batendo a cabeça, ficou doida, andava estralando os dedos e falando sozinha, quando chegava perto de alguém cheirava seu pescoço, e piscando fundo perguntava quem era fulano.

A prima Cidinha levou uma pedrada na coxa e ficou manca, coxeava lançando os braços para os lados acertando quem estivesse pela frente.

O irmão mais velho de Marta muito alto e magro, resolveu pescar sentado na pedra, sentiu sendo levado suavemente pelo cheiro dos sabonetes de tantos anos, ainda viu a irmã a lhe dar adeus, Max o cão pulou e foi junto com o dono pensando se tratar de uma brincadeira, não voltaram.

Nessa época Marta já com dezesseis anos, linda e distante, a família cochichava tentando achar uma saída, alias um fim para menina seria o termo exato, várias sugestões foram dadas, afogá-la seria o mais certo, mas todos tinham medo do rio, facadas disseram os homens, as mulheres rejeitaram, a menina ia ficar com a pele marcada e isso era inadmissível, ai sugeriram matá-la sufocando quando dormisse, porém Marta dormindo era uma santa, impossível seria um sacrilégio.

Assim os anos correram a mata ameaçava fechar a todos na casa agora verde entrelaçada de cipós.

A avó um dia a passear viu um brilho incomum, ao se abaixar tropeçou nas próprias pernas, caiu e furou um olho no caco de vidro que brilhava, desesperada com o sangue que jorrava, pediu ajuda a neta que a levou para a beirada do rio, a velha lhe escapou pelos dedos e foi afundando nas água barrenta.

Pouco a pouco a família foi definhando, alguns fugiram com medo do futuro, o avô frágil com o andar lento, ficou preso no forno quando foi limpa-lo, e morreu torradinho, virou pó e se misturou ao adubo caseiro, foi parar nos últimos pés de couves, que cresceram tanto, enroscaram-se na paineira,e alguns meses depois morreu.

O pai, Marta e uma cabrita, ficaram por ali, ela ria, o pai pensava e pensava, tentando se esconder das risadas da menina, os banhos continuavam, a espuma a encobria totalmente, branca e linda.

O rio veloz seguia seu caminho, a casa totalmente encoberta de cipós mais parecia um casulo gigante, agora tinham que passar pelas frestas feita com o facão, o caminho até o rio virou uma passarela de árvores grotescas cujas raízes tomavam conta de tudo.

O pai um dia dormiu, foi encoberto pela folhagem exuberante, nunca mais foi visto, a cabrita conseguiu escapar. Marta dançava entre raízes e ria tocando os troncos secos e nodosos, os banhos eram demorados.

Um dia ela se preparou, nua as espumas foram crescendo se inchando. Ela ria muito, parecia uma noiva de branco, e ria ria, e sumiu no meio da espuma.

Alguns dizem que ainda ouvem o riso de Marta ecoando pela mata, outros que ela foi levada por anjos e assim a saga continua, e Marta ri.

Luzia Rastelli

Luzia Rastelli
Enviado por Luzia Rastelli em 29/05/2007
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