Figura
Amanheceu
a noite nem foi assim tão fria
como ontem que chovia.
Mas está a ventar...
Ele sentado em sua cama de papelão, mal forrada e com o pano a dar lambadas no chão, levanta a camisa e olha a barriga seca, cheia de fome.
Para ele o tempo estava recheado de horas infinitas. Nunca teve idade, é certo que tem tempo de vida, mas não um número para representar o quanto já tinha vivido desde o seu nascimento, se é que nascera.
Qualquer um que lhe desse um mínimo de atenção era seu deus, seu salvador, tirando-o por momentos daquela espessa e comprida solidão.
Quantas vezes já terá perdido a vida? Quantas vezes pensou: "Melhor a morte do que deixar de viver"
É que às vezes a morte, na falta de vida, nos basta.
Traz calçados uns sapatos rotos, sem meias., e sem meias medidas procura o seu café da manhã no saco que pegou ali no lixo.
"Que sorte! o lixo fica mesmo ao lado da minha cama!"
Não se dava conta de que aquilo nunca fora sorte e que ele, como outros, é que fizera sua cama à beira do lixo.
As gentes passam... A gente não vê... Agente não vê...
Ele olha, não pede com a boca, mas o seu corpo todo é pedinte.