Se liga, boy, que pinta também é gente.

Não sou pinta. Nem playboy. Na verdade, não me encaixo em nenhum dessas tribos que circulam pela cidade de Natal. Não por achar que é errado ou feio, apenas não me encaixo. Sempre fui estranho ao ponto de nunca me situar em um só grupo. Fazia amigos com todos eles. Tenho amizade com pintas. Tenho amizade com playboys. Conheço pintas bagunceiros. E trabalhadores. Também conheço playboys bagunceiros. E trabalhadores. Sabe, não consigo entender a relação que muitos fazem entre a forma de se vestir e o caráter. Assim fosse, todo policial deveria ser honesto ou todo religioso deveria ser bom, e – quem sabe – todo estudante do CEI deveria ser educado. Não. Não é a forma com que falamos, ou nos vestimos que diz quem somos. Outro dia li essa notícia em um jornal “tendencioso” da Grande Natal que tinha como título: BARRARAM OS PINTAS NA ENTRADA DO MIDWAY MALL – o maior shopping do estado. Fui atrás de mais informação sobre esse assunto. Cheguei até a presenciar esse tipo de situação. Constrangedor. Para mim. Para os Pintas. E para o Midway. Antes de comentar minhas conclusões sobre o assunto, vamos entender um pouco do que aconteceu. Se existe um tipo de frequentador assíduo daquele shopping, esses são os alunos do IFRN. Imaginemos que em um dia qualquer, por qualquer motivo, um grupo isolado desses alunos brigassem ou fizessem algum tipo de baderna lá dentro. Então a gerência do estabelecimento decide barrar todos os menores de idade que usam a farda da escola. Parece uma atitude estranha, não? No mínimo, discriminatória. Pois é, se fizermos um resumo do que aconteceu, é só substituir os alunos do IFRN pelos – segundo alguns comentários que vi – “malditos” pintas natalenses. Comentários do tipo, “É pra se f**** mesmo, quem mandou não se vestir como uma pessoa de bem.” ou “Que a limpeza social comece”, me fizeram questionar e rever alguns conceitos selados de nossa cidade, principalmente, aqueles ligados ao que REALMENTE é ser uma pessoa de bem. Afinal, o que não é ser de bem? Vestir camisa da Cyclone, ou usar sandálias da marca Kenner, não me parece opções plausíveis. Será que apoiar a limpeza social – termo da sociologia que se refere à eliminação de elementos sociais "indesejáveis" – nos define como um bom cidadão? Desculpe-me quem concorda, mas não acredito nisso. “Ah, por um todos pagam. Afinal, como vamos saber quem bagunça e quem não?”. Sim, esse é um ponto muito importante nessa reflexão. E a resposta é bem simples. Não temos como saber quem irá bagunçar. E não podemos – quer dizer – o shopping não pode sentenciar um todo, por um erro de um pequeno grupo. Não existe isso de: se um faz, todos farão. Não se pode impedir alguém de entrar em um estabelecimento por estar “mal vestido”. Isso é crime. Punível com prisão de até 2 anos mais multa. Não sou hipócrita ou ingênuo ao ponto de dizer que nenhum deles irá causar algum tipo de dano ao shopping. É possível. Assim como é possível qualquer outro tipo de pessoa causar. Contudo, barrá-los na entrada do shopping me soa muito mais como uma “limpeza” do que uma “precaução”. Se liga, boy, pinta também é gente. E como a gente, tem o direito de frequentar o mesmo shopping.

Gonzaga Neto
Enviado por Gonzaga Neto em 26/01/2015
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