Longevidade

O sobrado de madeira do seu Tibério parecia anacrônico, espremido entre um grande magazine e um prédio de escritórios. Construída no fundo do terreno, mal aparecia entre toneladas de concreto e vidro da arquitetura contemporânea do centro da cidade. Na rua, o movimento intenso dos carros, transeuntes em passo rápido nem reparavam a casa e seu quintal florido.

Fortunas já foram oferecidas pelo magazine e pelo dono do prédio para a compra do terreno. Claro, apenas o terreno importava, a casa iria imediatamente para o chão e o espaço viraria um novo prédio de estacionamentos. Tibério, morando sozinho, desde a morte da esposa, sequer cogitou em aceitar uma das propostas. Os filhos tentavam mostrar as vantagens da venda, mas nenhum argumento o seduzia. O que fazer com tanto dinheiro, pensava ele. Viajar sozinho? Morar numa casa maior e melhor, sozinho? Ali pelo menos tinha as lembranças da esposa.

- Nesta casa foi onde, por cinquenta anos, vivi com a mãe de vocês. Para o desespero dos filhos, na última tentativa, Tibério foi taxativo: - não vou vender, se quiserem, vendam quando eu morrer.

Nos seus setenta anos, Tibério encontrava-se com perfeita saúde e se seguisse a média da família, deveria ir pelo menos até os noventa.

Resignados com a decisão do pai, só restava maldizer essa longevidade inoportuna.

Nilo Paraná
Enviado por Nilo Paraná em 03/02/2015
Reeditado em 03/02/2015
Código do texto: T5124499
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