Bloco do Gibran

Bloco do Gibran







Aleijadinho teve um sonho profético, antes da virada dos 1800, antes que alguém o descrevesse como uma gárgula medieval, "a boca entortou-se, como sucede frequentemente ao estuporado; o queixo e o lábio inferior abateram-se um pouco; assim o olhar do infeliz adquiriu certa expressão sinistra e de ferocidade, que chegava mesmo a assustar a quem quer que o encarasse inopinadamente. Esta circunstância e a tortura da boca o tornavam de um aspecto asqueroso e medonho". O sr. Lisboa teve essa visão numa tarde delirante, assombrou-se com um profeta parido em duas instâncias, a primeira tímida e insinuante numa paisagem árida, pobre de coisas, a segunda instância concreta e estapafúrdia, alvejada de aço, concreto, luminosos, trens subterrâneos, autos, frenesi de homens e mulheres, impensável caldeira moendo e fazendo nascer de novo.

O escultor esfregou os olhos e tratou de não pensar mais nisso, estava às voltas com o santuário de Bom Jesus dos Matosinhos. Que profeta seria aquele que entrara em sua realidade?

Ninguém nunca poderá provar que Aleijadinho não tenha sofrido esse vislumbre. Com esta falta de provas e a liberdade para pensar, perceber e criar nasce no carnaval 2015 o Bloco do Gibran.

Seus integrantes não saem às ruas; se saíssem, não estariam fantasiados de Exsicatas.

Nem todos os membros foram contabilizados, alguns preferem o anonimato. Outros são notórios foliões que de bom grado participam do recém criado cordão. Podemos citar aqui sem prejuízo o Dr. Hamer, que desenvolveu um bisturi não traumático (Hamer-Scalpel) vinte vezes mais cortante que uma lâmina de barbear, além de uma traquitana especial para a cirurgia plástica e uma maca massageadora com ajuste automático aos contornos do corpo. Também compôs a canção que cura, "Mein Studentenmädchen", cuja harmonia e melodia afeta os níveis psíquico, cerebral e orgânico, e descobriu (a descoberta estava dentro dele mesmo) "As Cinco Leis Biológicas da Nova Medicina", válidas para pacientes de qualquer gênero, ofertando para toda a criação "a compreensão inteiramente nova da causa, do desenvolvimento e do processo natural de cura das enfermidades". Perseguido por autoridades alemãs e francesas por mais de 25 anos e vivendo no exílio em virtude de suas descobertas, dr. Hamer é muito bem vindo ao Bloco do Gibran.

Criado nas últimas 72 horas, sendo assim um bloco novo, ou se preferir um novo bloco, alguns estudos já foram feitos nesse ínterim e sabe-se que os que sambistas ficam transidos ao ouvirem "Quando ouço sua voz, a doçura e a realidade da vida reaparecem".

Como a presente página está sendo atualizada momento a momento com as algazarras da trupe novidadeira, ouvimos de alguns animados interlocutores que o Bloco do Gibran veio para dar voz a outros profetas, uns tais e quais que dizem que através de cada gesto de compaixão estamos trazendo o futuro para o presente e realizando a percepção da percepção.

Hoje é carnaval e pelas telinhas vê-se por toda parte a sonatina nada pastoril dos fanfarrões.

Acabam de chegar agora aos nossos estúdios foliões do citado bloco, os srs. Alfred Fritz-Popp, Pjotr Garjajev e Johan Boswinkle, físicos e médicos, entoando a marchinha dos biofótons, sobre a "luz que exalamos de nossos corpos em níveis muito fracos, que estão um pouco além do espectro visível - trata-se do nível de força da organização sub-quark de toda vida – animal, vegetal e humana igualmente. Precedem qualquer reação bioquímica do corpo".

O Bloco do Gibran deseja a todos um feliz feriado e esclarecemos que nesse mesmo instante parte de seu contingente tenta traduzir para outra parte que a mudança do medo para o amor é um processo confuso.



(Imagem: 24c Curtiss Jenny invert single, impresso em maio de 1918)
 
Bernard Gontier
Enviado por Bernard Gontier em 16/02/2015
Reeditado em 16/08/2020
Código do texto: T5139187
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