Relatividade

Quinze. Quinze é muito ou é pouco? Números são infinitos. Uma dezena e meia podem ser nada no meio dessa infinidade. Pode ser. O que é, entre idades, uma diferença de 15 anos? Pode ser nada, mas pode ser muita coisa.

Abigobaldo, desde a mais tenra idade, sentia atração por mulheres mais velhas. Talvez por ter mamado em peitos que não eram da mãe dele.

No Grupo Escolar Oswaldo Cruz, apaixonou-se pela mulher que lhe ensinou as primeiras letras. Com sarampo, recebeu da mestra uma visita e um livrinho de presente. Viu aquilo como pedido de casamento. Primeira desilusão amorosa.

Aos 13 anos, novo desencanto: menina de 17 trocou Abigobaldo por homem de 20. Quando chegou aos 17, apaixonou-se por mulher de 23. Não podia dar certo. A psicóloga casou-se com um médico. Mais velho, claro.

Quando estava com 23, Abigobaldo envolveu-se com mulher de 38. Quinze anos; onde está a diferença de idades para apaixonados? O casal viveu amor quente. E efêmero. A mulher mudou-se para sua terra natal e nosso herói encontrou seu verdadeiro amor. Por incrível que pareça, três anos mais nova do que ele. Casaram-se.

O tempo passa, o tempo voa. ICQ, Orkut, Face. Ah, o Face! Divorciado, Abigobaldo foi localizado por aquela mulher que o encantou 37 anos atrás. Viúva, a idosa mostrava o mesmo fogo de 1976. Em mensagem fechada, Edileuza convidou Bigó – era assim que ela o tratava – para se encontrarem e retomarem o relacionamento interrompido há décadas. Privilegiada econômica e financeiramente, a pós-coroa propunha que, se fosse o caso, Bigó voltasse para a vida dela feito tamanco: só com o pau e o couro. Mais pau do que couro, of course.

Vendo fotos atuais que Edileuza postou no Facebook, analisando a proposta, Abigobaldo pensou, pensou, pensou... e caiu fora. Diferença entre 38 e 23 é quinze; entre 75 e 60, também. Quinze muda de figura quando se trata de convivência entre um homem e uma mulher.

Encontrei-me com Abigobaldo no Santa Cerva – barzinho que jovens boa-vistenses transformaram em reduto. O que lhe resta de cabelos está negro e brilhante. Camiseta Brooksfield preta, tênis colorido com amortecedores, corrente prateada no pescoço, larga pulseira do mesmo material no braço esquerdo, dragão tatuado no bíceps direito, brincos nas duas orelhas, Bigó disse-me estar pensando em comprar uma Harley Davidson. Vendo-me espantado, justificou-se:

– Mudanças, brother! Se eu não desse uma guinada na vida, poderia terminar meus dias ao lado de tua mãe. – E ao meu ouvido, sorrindo: “Se bem que tua coroa, com 91, ainda dá um caldo meio grosso”.

Aroldo Pinheiro
Enviado por Aroldo Pinheiro em 17/02/2015
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