Boca de forno? Forno!

Quando eu era adolescente, onde eu morava havia um rapaz, dos seus vinte e poucos anos, que era mentecapto, como diziam, talvez uma vítima de paralisia cerebral e da cultura com seus algozes. Por dinheiro ele fazia tudo que lhe mandavam fazer. Quando digo tudo, não quero dizer tudo mesmo. Talvez poucos confiassem nele para vá à padaria e me compre um pão, pois não eram exatamente coisas úteis que ele fazia por dinheiro. O interessante é que, aos domingos, após a missa, ficávamos rodando a pracinha, as moças em direção contrária aos moços, o antigo footing¸ e eis que, de repente, um alvoroço, uma gritaria, o mentecapto sendo xingado com todos os palavrões a que se permitiam mocinhas recatadas em um pós-missa. Não era todo domingo, mas era bem mais que lá de vez em quando. Um dia fui testemunha ouvidocular da trama toda. Um careta chamou o mentecapto e disse Boca de Forno! E o mentecapto ficou calado olhando-o com olhos de mico. Tudo que seu mestre mandar? Ainda em silêncio o mentecapto. Lhe dou cinco cruzeiros se você for ali, for ali, for ali e levantar a saia daquela moça tal e tal! O mentecapto saiu correndo e sumiu. Daí a pouco, o alvoroço já conhecido, e, logo em seguida, ele surge reclamando, dinheiro! Dinheiro! Recebia as cinco pratas e sumia. A coisa se repetia de quando em vez, pois todos faziam de conta que não sabiam quem o incitava ao ato! Como faziam de conta que não sabiam, faziam de conta também que ninguém cometia um crime sendo o mandante e marionetando o mentecapto a partir de sua necessidade básica, dinheiro.

Quem entendeu, entendeu, quem não entendeu, entendesse!