Zumbi Moderno

Caminho, tal e qual um zumbi, entre as sombras intangíveis de um passado que insiste em renascer entre as minhas memórias. Por entre as diáfanas cortinas vislumbro meus sonhos realizados e as dores sentidas, vislumbro minhas alegrias e decepções, meus sucessos e fracassos.

Minhas emoções se confundem, mesclando todos os acontecimentos, o senso do dever cumprido amalgama-se à sensação de mil fracassos surreais ou verdadeiros.

Caminho entre os instantes de fama fugaz, revejo o assédio ao qual fui sempre reticente, revejo as trilhas do meu caminho e os atalhos que deixei de seguir.

Não existe para mim a bola de cristal que me permita ver o que poderia ter sido ou acontecido, as sombras escuras não me permitem ver o futuro de meus pretéritos alternativos e o que resta é uma voz sussurrante que me tortura tal qual um corvo de Poe, gralhando “Talvez....Talvez” ao invés de “Nunca mais... Nunca mais”.

Por mais que reveja minha atuação na extensa peça do teatro de minha vida, por mais que busque, aquela cena explícita, não encontro o momento exato onde meus sonhos sumiram, não encontro a causa, o gatilho que disparou a flecha elétrica que causou um curto-circuito nas sinapses de meu cérebro, travando o acesso ao processo de inicialização dessa partição do meu disco rígido.

Carrego em mim a sina de ser pensador, de vislumbrar o que se oculta por detrás do que se faz aparente aos olhos da maioria. Benção ou Maldição? Quem saberá responder? Se o sucesso é o encontro da preparação com a oportunidade, talvez eu ainda não tenha a encontrado, ou, por outro lado, talvez a tenha deixado passar por não reconhecê-la, como meu diamante, em meio ao mar de zircônios pelo qual todos nós navegamos.

Medo do sucesso a qualquer preço? Complexo de Don Quixote? Desprezo ao deslumbramento?

Aversão à fama fugaz? Auto-sabotagem? Comodismo ou frugalidade?

Ou será a simples falta de desafios reais, do tipo que possam trazer uma verdadeira satisfação à alma?

Talvez, o sentimento de ser o último de uma espécie em extinção, a solidão claustrofóbica de um guerreiro solitário cujas batalhas parecem não ter mais sentido em um mundo onde todos parecem ter caído de joelhos diante de massacrantes, intensas e hipnóticas falsas premissas que incutem as um ressoante sentimento de manada, destruindo todas as individualidades, maquiando ideias ditadas como se próprias fossem. Adolesceram-se os adultos e infantilizou-se a adolescência criando uma sociedade de crianças birrentas, egoístas e incapazes.

A nova escravidão, maquiada com ares de total liberdade, entranhou-se nas mentes e corações humanos,de tal maneira que os poucos que ainda buscam manter acesa a sua liberdade são considerados párias e escravos, seres imersos em correntes do passado, incapazes de aceitar a “evolução” da “nova” mentalidade social, cada vez menos ciente de suas responsabilidades.

O ser adulto transformou-se, em grande parte, numa quase obrigatoriedade em ser adúltero para corresponder às expectativas dessa nova sociedade que atira seus jovens na prostituição física e moral, seja ela remunerada ou não, cada vez mais cedo.