Visita a Würzburg, Alemanha

Deixamos Heidelberg saudosos. A rápida visita a tão expressiva localidade alemã, recheada de história de um passado distante, satisfez nosso desejo de conhecê-la como fora e, hoje, como o é – um tesouro arquitetônico de memórias centenárias dignas de admiração.

Os poucos dias desfrutados na acolhedora cidade causaram esse sentimento nostálgico, manifestado por ocasião de nossa despedida. Estamos certos, Lairton, Cristina, Matilde e eu, que a dor da separação somente será arrefecida quando nos dispusermos a revê-la. Se breve, não sei. Os dias vindouros não me pertencem. De todo modo, já desafivelei as malas para o almejado retorno, deixando-as protegidas do mofo.

A viagem com destino a Würzburg, distante duzentos quilômetros de Heidelberg, percorridos por excelente rodovia, durou menos de três horas, contados os minutos destinados ao esvaziamento das abarrotadas bexigas, e com o fito de minorar o frio com um cappuccino quentinho, ao gosto do freguês.

Viajamos tranquilos, guiados pelo GPS, versátil bússola dos tempos modernos. Não tememos o desconhecido nem a distância até o nosso destino. O veículo que nos transportava, da marca Opel, deslizava macio pela autobahn bem movimentada, concorrendo em estabilidade e conforto com seus similares da BMW, Mercedes Benz, Audi, Volkswagen, Porsche, entre outros.

Ansiávamos por conhecer Würzburg. Enquanto vencíamos a distância, contemplávamos a paisagem às margens da autoestrada, um convite imperdível para inesquecível passeio. O verde das árvores e das plantações rasteiras associava-se ao desfile arquitetônico das construções típicas da região, tal qual excelente colírio para os olhos cansados do belo, e, ainda, como eficiente sedativo destinado a minorar os efeitos estressantes das preocupações cotidianas.

Ficamos hospedados no Novotel, situado na Kurfuerstenanlage, onde permanecemos por dois dias destinados à visitação desse aprazível lugar, a ser descrito tanto quanto a lembrança me permitir.

Acomodadas as malas, não perdemos tempo. Fomos imediatamente entregar à locadora Hertz o veículo alugado em Munique, com o qual percorremos centenas de quilômetros durante o período de nossas visitas a Füssen, Schwangau, Regensburg, Rothenburg e Heidelberg.

A multa de trânsito por estacionamento irregular em Füssen, conforme relatado em crônica anterior, no valor de vinte e cinco euros, foi paga quando do retorno ao Brasil, em obediência a orientação da proprietária do veículo.

Não medimos esforços a fim de conhecer mais esta joia do patrimônio alemão, de 135.000 mil habitantes, situada na região da antiga Francônia, atual Baviera, espraiada nas duas margens do rio Main ou Meno, denominação esta que também lhe é atribuída. A cidade é famosa pelo cultivo de uvas destinadas à produção dos excelentes vinhos da região.

A pé ou de táxi, percorremos ruas antigas da interessante comunidade, cujo advento, diz-se, data de mil anos antes de Cristo, embora somente tenha tido seu nome mencionado pela primeira vez, em 704 de nossa era.

No ano 686, os missionários irlandeses Kilian, Kolonat e Totnan iniciaram a divulgação do cristianismo na região, mas somente em 742 foi fundada a primeira diocese, por São Bonifácio. O primeiro templo católico é datado de 788, construído onde, atualmente, está erigida a St. Kilian Cathedral.

Würzburg é uma comunidade edificada em estilo barroco, tendência surgida na Europa entre 1600 e 1760, caracterizada pela abundância de elementos decorativos. É atrativa e famosa por ostentar em seu currículo arquitetônico obras de épocas diversas e de estilos inconfundíveis. Enumerá-las não será fácil para quem desfrutou de sua hospitalidade por tão poucos dias. Mas, travestindo-me de audaz escritor, tentarei descrever o que viram meus embasbacados olhos.

Para enaltecer seus encantos, bastaria dizer que a cidade foi contemplada com o título de Patrimônio Cultural da Humanidade, honra concedida pela UNESCO, em 1981. Essa informação, talvez, já bastasse. Mas, vamos adiante!

Em nossas andanças, vencendo o cansaço, fazendo-nos fortes para superar as limitações da idade, frequentamos significativos lugares, a seguir descritos com a mais sincera fidelidade.

Na noite do primeiro dia, estivemos no pátio do palácio Würzburg Residenz ou Residência de Wurtzburgo, maravilhados com a beleza exterior do monumental edifício, cuja construção ocorreu entre os anos de 1720 e 1744.

Na entrada do jardim do Residenz encontra-se uma placa escrita em oito idiomas, indicando o início e o término da chamada Rota Romântica da Baviera, que tanto poderá ser iniciada em Würzburg quanto na cidade de Füssen, a 385 quilômetros da primeira.

A obra foi erigida a mando dos príncipes-bispos Johann Philipp von Schönborn e seu irmão Friedrich Carl von Schönborn. Durante o Sacro Império Germânico-Romano, a Igreja Católica, do alto do seu poder, estabeleceu que seus bispos exercessem funções antes atinentes à realeza.

Lamentamos profundamente não termos visitado o interior da Würzburg Residenz, local que certamente nos fascinaria. Teríamos visto o esplendor de sua riqueza arquitetônica, a beleza do mobiliário e o bom gosto da primorosa ornamentação de seus impressionantes ambientes, somente vistos em postais adquiridos em lojas do ramo. A omissão, todavia, deve ser debitada à organizadora do itinerário, que programou limitada estada nessa encantadora localidade. Nada podíamos fazer, pois já estávamos com passagem marcada para retorno ao Brasil.

Volto à descrição de nossos passeios por Würzburg, narrando parte de sua história: Até início do século XVIII, os príncipes-bispos ocupavam a Festung Marienberg ou Fortaleza de Marienberg. A partir daí, transferiram suas residências para o novo palácio, ou seja, o Würzburger Residenz. Hoje, a Festung Marienberg funciona como museu. Durante cinco séculos, porém, serviu de residência ao privilegiado clero da Igreja Católica.

No ano 1525, quinze mil homens de um exército de camponeses, daí chamar-se a operação de Guerra dos Camponeses, não conseguiram invadir a inexpugnável fortaleza, graças às fortes muralhas que a cercavam.

Derrotados na primeira investida, os camponeses tentaram nova incursão bélica, sendo impiedosamente vencidos pelas tropas do Príncipe-Bispo, que mandou massacrá-los, inclusive cegando muitos dos insurgentes.

Em 1600, Julius Echter reconstruiu a Marienberg, transformando-a em palácio de estilo renascentista. Depois da Guerra dos Trinta Anos, ocorrida em 1631, a fortaleza foi novamente reconstruída, desta feita em estilo barroco.

Continuamos nossas visitas ao longo do dia 10 de novembro de 2014. Estivemos na St. Kilian Cathedral, uma das maiores igrejas românicas do país. O altar mor é em estilo rococó, ou seja, caracterizado pela exibição de elementos da natureza. O interior do templo é simples, enriquecido por lindo órgão e esculturas de santos católicos.

A Praça do Mercado, onde está localizado o estabelecimento destinado à venda de gêneros alimentícios e de outros produtos é bastante simples. A Market Square agrada à vista e satisfaz o paladar de seus frequentadores, principalmente turistas que abusam do consumo dos famosos vinhos da Francônia, região onde se localiza a cidade. Lairton, Cristina, Matilde e eu não nos negamos a saborear a famosa salsicha branca, característica da cozinha alemã.

Nas proximidades da Praça do Mercado, conhecemos e fotografamos a Capela de Santa Maria, ao lado da qual se encontra a casa de falcão ou Falkenhaus, prédio em estilo rococó, que na Idade Média serviu de residência a ricas famílias da região.

Consideramos oportuna a feliz escolha de passarmos alguns instantes transitando pela ponte antiga da cidade, sobre o rio Main, denominada Alte Mainbrücke, construída de 1473 a 1543. As muretas de proteção foram contempladas, em 1730, com estátuas de santos católicos.

Na ocasião, abusamos das máquinas fotográficas, registrando, assim, nossa estada por tão significativo lugar. Seria imperdoável não fotografar e filmar a bela paisagem que se descortinava à distância, entre as quais a antiga fortaleza, ou seja, a Festung Marienberg, visitada apenas externamente, em virtude do horário ser incompatível com a visitação ao museu.

Pelo rio Main, singrando mansamente sob a estrutura da ponte antiga, a Mainbrücke, enormes embarcações singravam rumo a outras regiões do país, transportando produtos para o viçoso mercado alemão.

Depois de ultrapassarmos a lendária ponte, chegamos a certo local da cidade, palmilhando-o de forma exploratória e curiosa. Cansados e satisfeitos com o que vimos, retornamos rápido, em atendimento a inadiável pretensão: degustar os excelentes vinhos da Francônia, em estabelecimento típico localizado em uma das margens da ponte, e para atender aos reclamos dos estômagos vazios, solicitando-nos, insistentemente, a ingestão das saborosas salsichas alemãs.

Propositadamente, deixei o relato seguinte para os instantes finais desta narrativa. Intencionei não transmitir ao leitor imediato conhecimento sobre a amarga verdade ocorrida durante a Segunda Guerra Mundial. Imagino que os mais estudiosos, o que seria incluir todos os meus leitores, sabem dos acontecimentos daquela época. O sofrimento humano e a destruição de monumentos históricos de Würzburg, citada para particularizar tamanha desventura, encontram-se gravados em nossa memória como lamentável recordação.

No dia 16 de março de 1945, uma ação bélica de grande intensidade, comandada pela Real Força Aérea, bombardeou e quase destruiu a cidade de Würzburg. Da incursão aliada, resultaram devastados 90% dos edifícios centenários, palácios, igrejas de renomada apreciação artística e religiosa, pontes, infraestrutura diversa, obras de arte e tudo o mais que compunha as preciosidades relatadas neste texto.

Foram impiedosamente bombardeados a St. Kiliam Cathedral, a fortaleza denominada Festung Marienberg, o palácio Würzburger Residenz, a Alte Mainbrücke (ponte antiga), a Capela de Santa Maria, entre outros. Resultaram poupados dos inevitáveis incêndios provocados pelos bombardeios aéreos, o vestíbulo, a galeria do jardim, escadarias, galeria imperial e parte dos telhados do Würzburger Residenz. Vinte e cinco anos depois, em 1970, a cidade de Würzburg estava quase totalmente reconstruída. Hoje, completamente. Foi assim que a vimos.

No dia 10 de novembro de 2014, comparecemos à estação ferroviária local para embarcar no Trem Bala, com destino a Frankfurt, distante cento e vinte quilômetros de Würzburg. Durante a excelente viagem, acomodados em cabine de primeira classe, saboreando um vinhozinho gostoso, sentíamos a distância ser vencida a 320 quilômetros por hora.

Essa foi a penúltima etapa da viagem. A próxima será a Frankfurt, da qual falarei na próxima crônica. Espero contar com sua atenciosa leitura.