Lago e Rio
Minha vida era um lago. Eterna calmaria, inércia, lodo acumulado e escondido no fundo, águas doces paradas, sem sal, sem tempero, leve e insistente desespero.
Sonhava ser um rio, correr montanhas e vales, arrastar com sua correnteza o que estivesse em seu caminho, contornar obstáculos, seguir sempre em frente. Desaguar no mar, me misturar, sem perder e lhe encontrar em meio a um oceano ou em areias de praias desertas e paradisíacas.
O lago passivo me oprimia com suas margens fixas e limitadoras, seu ciclo finito e suas horas intermináveis. Seus dias previsíveis e iguais tornavam seu isolamento protetor uma maldição, suas águas que serviram de espelho para Narciso, estavam agora , muito aquém do que lhe era preciso.
Não se expandia, parecia ter um acordo tácito de não invasão recíproca em suas fronteiras, delimitado, acorrentado e isolado.
Implorava aos céus por uma chuva, um movimento, mesmo que tênue e fugaz, precisava revolver minha base, agitar meu espaço, trazer à tona meus questionamentos, minhas opções, voluntárias ou não.
Até que choveu você, o lago alagou, trouxe vida ao seu redor, fertilizou a terra em volta , encontrou seu rio, mesclei-me a você e juntos corremos unos em busca da felicidade, sem represas, sem fronteiras, sem limites ...