A borboleta preta

Ao iniciar este texto me lembro de uma frase de Padre Fábio de Melo, dita no seu Programa Direção Espiritual, na Canção Nova – “ Escrever é como fazer pão, é preciso que haja o tempo de fermentação”.

Fermentei por muito tempo, exagerei, esperei demais sem que o meu desejo de presenciar o colorido das minhas borboletas acontecesse por mais algumas vezes.

Esta demora me obrigou a mudar o título que seria “As Borboletas Coloridas” para “ A Borboleta Preta”.

O jardim é o cantinho da minha casa que me diverte, me descontrai e me faz observar com carinho a natureza e, com tristeza, constatar que ela não vai bem, uma vez que é perceptível o desequilíbrio ecológico que acontece a cada dia.

Em uma manhã de maio, há alguns poucos anos, tive o prazer de presenciar dezenas de borboletas nectarívoras, de um colorido fantástico, que se misturavam com as cores das minhas flores, que as atraiam pelo seu colorido, odores, pólen e néctar.

Era um verdadeiro “panapanã”, tornando mais lindo o meu pedacinho de chão, que me retribuía com aquela paisagem o trabalho de adubar, molhar, fofar, limpar e todo carinho que a vida, em qualquer reino da natureza, precisa para que se desenvolva.

Encanta-me molhar o meu jardim e sobre a água aspergida olhar os beija-flores tomando o seu banho, batendo as suas asas, como que agradecendo por aquela aspersão dos pingos sobre o seu frágil corpo, momento que, talvez, a mim me agrada mais do que a elas, a minha recompensa seria bem maior ao observar aquele quadro.

Quadro que se repete sempre. Às vezes apareciam duas, três no seu tamanho adulto. Desapareciam por um período e eis que surgem duas ou mais ainda filhotes o que me alegrava por perceber que a natureza, neste particular, está cumprindo o seu papel.

Em algumas ocasiões, era gratificante ver alguns pássaros de peitos amarelos, os quais, meu pai, na sua sabedoria de homem do campo, comigo a observar, os designava de “Primas”, vindo eu descobrir depois, pelo seu canto, que se tratava de bem-te-vis. Primas ou bem-te-vis já não existem mais.

E as pombinhas fogo-pagou? Elas, por muito tempo fizeram seus ninhos nos meus pés de oiti pelos quais eu zelava, até seus filhotes ganharem o mundo, batendo suas pequenas e ainda frágeis asas.

Lá se foram meus beija-flores, lá se foram meus bem-te-vis. Onde estão minhas fogo-pagou? Que falta fazem minhas borboletas coloridas! E minhas lagartixas? Que um gato da vizinhança sorrateiramente pula o meu muro e as devora.

Molhar o meu jardim para que pelo menos o seu colorido eu possa curtir, faz parte dos meus afazeres. Domingo, final do dia, momento oportuno para esta atividade e, qual não foi a minha surpresa, quando ao aspergir a água em um pequeno arbusto, sai da sua folhagem uma borboleta preta, grande, linda mas solitária, porém ela me inspirou a tirar da fermentação este texto, não mais com o título que desejava de “As Borboletas Coloridas” mas “A Borboleta Preta”.

Percebi que nem mesmo os versos de Mário Quintana, que por muito tempo levei-os como lição, não me serviram mais. Cuidei do meu jardim e as borboletas se foram. O que fazer agora? Seria até capaz de correr atrás delas.

“ O segredo é não correr atrás das borboletas...

É cuidar do seu jardim para que elas venham até você”.

Mário Quintana.

Diná Gomes Fernandes
Enviado por Diná Gomes Fernandes em 15/05/2015
Código do texto: T5242535
Classificação de conteúdo: seguro