Minha vida.

Não faz muito tempo desde aquela noite... Lembro-me de correr até a janela de meu quarto e observar o céu. As luzes da cidade não me permitiam ver claramente, mas eu enxergava um céu estrelado. As estrelas formando formas humanas ou animais coladas na imensidão do céu.

Naquele dia o céu estava bem azul; a lua, cheia. E essa iluminava minha cidade preguiçosamente como se já tivesse feito isso por longos anos, mas mesmo assim não desistisse de seu posto. Então meu olhar subia e se perdia lá em cima, em meio às estrelas.

Ficava me imaginando lá em cima, brincando nas estrelas, pisando nas nuvens. Eu queria chegar ao céu. Mas não queria voar. A mera ideia de voar arrepiava-me os pelos de medo.

Eu era uma criança.

E as coisas eram tão simples naquele tempo.

Eu podia confiar nas pessoas sem ter medo de me machucar. Eu podia ficar dias sem fazer nada e não me preocuparia com minha vida escolar. Eu podia fazer o que minha mãe deixasse, não o que a sociedade permitisse. Minha mãe era minha lei, não outras pessoas.

Eu podia chegar ao céu. Mas não fui.

Não fui porque o medo me grudava no chão, me impedindo de realizar meu sonho. Lembro-me de querer levar minha irmã até as nuvens e correr livremente com ela por lá. Mas nunca a convidei, por medo que ela negasse.

Então os anos se passaram. E em alguma época dentro deles, perdi o costume de ir até a janela, de observar o céu. Para mim, viraram apenas estrelas, não mais um universo que eu podia explorar. O céu virou um pequeno expectador de minha vida.

Eu cresci, perdi meus costumes infantis, mudei meus hábitos, mudei minhas festas, mudei meus pensamentos, mudei meu jeito de ver o mundo.

Eu sabia que qualquer um poderia me decepcionar agora. Eu sabia que não teriam pena de mim. Eu sabia que eu precisaria afundar nos livros todos os dias se quisesse ter um bom futuro. Eu sabia que tinha responsabilidades e que mesmo se o mundo caísse, eu precisava cumpri-las.

Então cresci ainda mais. E mais costumes foram deixados de lado, mais conceitos foram esquecidos, mas hábitos foram mudados.

Eu estou chegando na fase adulta agora. Tenho maiores responsabilidades, criadas por mim mesma, temo mais ao mundo e tenho ainda mais fé. Fé de que as coisas vão dar certo se eu fizer por merecer. Tudo bem se não der certo agora, o universo há de me recompensar por meus bons atos. Tudo bem se nada der certo, talvez eu ainda tenha as pessoas que amo por perto e isso será suficiente.

Mas mais importante de que isso, todas as vezes que eu chegar perto da janela, me lembrarei de que eu podia ir ao céu.

Podia viajar entre as estrelas, podia correr sobre as nuvens, podia ter a vida perfeita. Não existiam dificuldades, não existia sofrimento, não existia a dor. Era só uma criança sonhando em pisar na lua enquanto dormia, era só um sonho de criança. De uma criança inocente que cresceu e hoje pode falar com segurança que teve a melhor infância do mundo. A criança que hoje pode dizer que tem saudades daquela época em que tudo era fácil. A época em que a única preocupação era quem subiria na arvore mais alta. Era tentar esconder minhas artimanhas de minha lei, de minha mãe.

Um criança que diz com orgulho que não pulou nenhuma etapa da vida e que se lembra perfeitamente de todas elas. Mas aquela...

A infância é a melhor parte de sua vida, sempre será. Não perca isso tentando ser adulto mais rápido. Ser adulto não é legal. E quando a vida me mostra isso, minha vontade é correr. Correr até a cama de minha mãe e deitar ao seu lado em posição fetal para que ela me proteja. Pois um dia fiz isso.

E naquele tempo a vida não me cobrava saída da proteção de minha mãe.

A vida não me cobrava nada.

Era a parte mais feliz de minha vida. Pena que eu não tinha consciência disso.

Milena Hipólito
Enviado por Milena Hipólito em 23/05/2015
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