A primeira vez ninguém esquece


Todas as suas amigas já haviam tido a primeira vez com algum garoto. E faziam questão de demonstrar que estavam anos luz na sua frente. Ela, porém, por mais que tivesse seus candidatos a ficantes, nunca tivera a chance de beijar nenhum deles, por pura falta de oportunidade. Na escola, não se arriscaria a ser flagrada pela direção ou por algum professor louco pra disciplinar alguém, segundo os princípios da moral e dos bons costumes. Isso seria muito frustrante e poderia comprometer seriamente o seu início na vida amorosa. Embora soubesse que atrás da quadra esportiva da escola, houvesse um "beijódromo" a céu aberto. Havia aqueles adeptos do risco constante, o que, definitivamente, não era o seu caso.

Em casa, seus pais mantinham uma educação linha dura, não a permitindo frequentar festas, nem mesmo dá uma voltinha na praça durante a noite.

No entanto, teoricamente, Bel já se sentia graduada e especializada na profana arte de beijar. "Instruções" adquiridas através dos manuais de primeiro beijo, nas revistas que lia (Capricho, Carícia...) e, principalmente, assistindo às cenas de beijos ardentes e apaixonados entre os protagonistas das novelas. Assistia todas elas, das seis, sete e oito. Havia memorizado todos os movimentos de cabeça, sabia exatamente o que fazer quando o momento mágico chegasse, ou a primeira boca se aproximasse.

Depois de ter cumprido seu dever de cristã, indo à missa ao domingo à noite purificar-se de seus pecados de adolescente, conseguiu, depois de suas orações oferecidas a Santo Antônio, dá uma escapulidinha até um barzinho que havia na praça, próximo da Igreja. Quando se prioriza a devoção em detrimento da diversão, todos os santos ajudam. Ou quase...

O fato é que Bel estava prestes a perder o rótulo de "boca virgem". Finalmente, veria as tão faladas estrelinhas, o mundo giraria à sua volta, as borboletas voariam no seu estômago querendo se libertar, saindo pela boca juntamente com seu coração aos pulos! E mais algumas sensações indescritíveis... Assim deveria ser.

Naquele ambiente turvo, embalados por um som brega, breguíssimo, diga-se de passagem, que em nada ajudava, Bel e o... Como era mesmo o nome dele? Bem, ela esquecera o nome (e a cara dele também). Mas, isso não interfere na sequência da narrativa.

Sentados, mal conseguindo enxergar um ao outro, de repente, não mais que de repente, eis que suas bocas se uniram arrebatados por um gesto impetuoso, mas já ansiosamente aguardado (antes tivesse aguardado por mais tempo). A impressão que tivera é que haviam obstruído seus dois canais respiratórios e ela estava prestes a morrer asfixiada com aquela língua invasiva movimentando-se dentro de sua boca. Com a respiração presa, como se estivesse dentro d'água, já estava quase ficando roxa, coitada! Resistiu o quanto pôde, até que através de um gesto desesperador, afastou subitamente aquela boca assassina de perto da sua.

Uffa! Arfando de forma ritmada, tentando oxigenar seus pulmões novamente, ela se perguntava o que havia acontecido ali?! Aquilo era o tão sonhado e desejado beijo?! Ele, o... O garoto ( nem tão garoto assim) estava paralisado, sem entender aquela sua expressão de espanto diante de um "simples" beijo.

Bel, ignorando a cara de palerma do sujeito, levantou- se e tomou o caminho de casa, convicta de que em se tratando de beijo tudo não passara de propaganda enganosa. Ao invés de borboletas e estrelinhas flutuando, uma tentativa de sufocamento, isso sim! Um fiasco!

Só muito tempo depois, assistindo a uma de suas novelas favoritas (as novelas tem lá seu papel social), ela ouve do galã apaixonado, à la estilo mexicano, uma declaração para sua amada, onde ele dizia: "adoro sentir sua respiração quente enquanto nos beijamos"!

Ela: "Hããã?? Então se pode respirar enquanto beija??" (Risos intermináveis)


 
Rosimayre Oliveira
Enviado por Rosimayre Oliveira em 27/05/2015
Reeditado em 10/06/2015
Código do texto: T5257206
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