SIMPLICIDADE

Sandra Mamede

 

No mundo atual, onde as drogas fazem moradas na maioria dos nossos jovens, onde a desonestidade  e a corrupção estão no ápice da moda, onde a injustiça convive e divide conosco o dia-a-dia, tudo o que deveríamos considerar como normal, como uma simples obrigação de um cidadão nos surpreende a ponto de ficarmos deveras agradecido. Coisas simples como um bom atendimento de uma recepcionista, de uma telefonista, de uma enfermeira, etc

Estamos acostumados a sermos tratados como verdadeiros lixos humanos, com prepotência, descaso, discriminação. Quando falo em discriminação o digo em todos os sentidos, a discriminação racial, econômica, sexual, social e muitas outras.

Não estou aqui pré-julgando ou julgando ninguém em especial, mas a nós, a nós seres humanos. Achamos que estamos acima de todas essas coisas, mas muitas vezes agimos dessa mesma forma.

Trabalho com adultos e adolescentes  de uma maneira geral e conheço isso de perto, a sala de aula é um mundo, e nele, existe de tudo, as facções, as preferências, as discriminações e muitas vezes a violência transporta-se para dentro deste mundo.

Muitas pessoas que exigem serem tratadas não  pelo que são mas sim pelo que possuem, pessoas que sequer têm uma formação acadêmica, mas exigem serem chamadas de “doutores”, pois acham que esse pronome de tratamento antecedendo o seu nome o fará ser mais respeitado, ter mais poder sobre todos, e uma distinção na pirâmide das classes sociais.

Um amigo médico, emprestou-me um livro  cujo título é um tanto cômico; “O Médico que Não sabia fazer BILU-BILU”, de Eloi Zanetti, trata-se da história do relacionamento “médico-paciente”, e agora   volto a falar sobre esse assunto que muito me incomoda, o posicionamento que certos médicos tomam em relação aos seus pacientes, tratando-os com descaso, impaciência, como simplesmente mais um número de um Plano de Saúde. Alguns consideram-se um verdadeiro “deus”, acima de tudo e de todos. Não olham os seus pacientes como seres humanos iguais a ele, pois ele( o médico) não passa disso, também um ser humano, também susceptível às doenças e que futuramente de médico passará a paciente.

Nessa nossa esfera global, diferimos sim um dos outros, não somos “robots” para sermos fabricados totalmente iguais,  trocando somente o número de série. Somos seres humanos, e assim sendo, temos a nossa personalidade, o nosso livre arbítrio. Cada um com a sua personalidade, como o seu jeito de ser, de agir e de pensar, numa luta constante entre o bem e o mal que faz parte do nosso âmago. É nesse momento eu quero falar de uma qualidade que hoje em dia quase não encontramos nas pessoas...a simplicidade. Não importa o que você tenha de bens materiais, não importa a sua formação acadêmica, não importa o cargo que você  exerce, o que importa é sua tomada de consciência de que você não é isso tudo que possui, que você  não é o cargo que ocupa, que tudo isso é uma fase. As coisas materiais passam, os cargos são transferidos para outros, então...você é, o que realmente é. Tudo vai transparecer na forma como você vive, como trata as pessoas, como se comporta.

Estou escrevendo essa crônica para uma pessoa que passou pela minha vida há muito tempo atrás, porém nessa época não tive muito contato com ela e também eu ainda lutava contra essa louca vontade de registrar tudo através dos meus contos, minhas crônicas, minhas poesias, entretanto, hoje, acho uma injustiça não deixar registrado essa minha observação pois o destino me fez encontrá-la mais uma vez em outras circunstâncias.

Ele sabe que essa crônica é especialmente para ele, avisei-o de que  a escreveria, talvez até não me tenha dado muito crédito, mas hoje terá uma surpresa quando lê-la. Falo especialmente dele e para ele , mas é claro que ela se enquadra para todos. Falo dele devido a essa qualidade que citei acima que está praticamente em desuso, a simplicidade e ligada a ela está também a humildade. As pessoas costumam associar erroneamente simplicidade a vulgaridade e humildade a inferioridade, mas isso não é verdade.

Pessoas simples , são aquelas que tratam o seu semelhante de igual para igual e não como um ser inferior, apesar de terem uma formação acadêmica ou pertencerem a um outro nível econômico-social. Pessoas humildes, são àquelas que mesmo estando num cargo mais alto, ouve a opinião dos seus subalternos, valoriza o trabalho de todos os que o cercam, que sabe quando tomar uma atitude mais severa quando isso se faz necessário, sem contudo  humilhar. E essa pessoa de quem falo é assim, simples e  humilde. Trata a todos, tanto clientes como funcionários com simplicidade, humildade e igualdade. Na verdade, ele trabalhando não é diferenciado, pois  na sua simplicidade não faz questão de deixar transparecer se é um simples funcionário ou proprietário, dessa forma é muito querido e muito respeitado, e tenho certeza que não somente por mim que reparei atentamente nisso, mas por todos os que com ele convivem. Esse, no país em que vivemos, é um exemplo de cidadania, de integridade, de bom caráter e acima de tudo de humanidade.