ANDANDO A PÉ

 
Ainda não criei coragem para fazer caminhada, mas continuo adorando andar a pé, prática cada vez mais incomum nas urbes. Ontem (mais uma vez) “subi no ônibus errado" e como faço sempre que isso acontece desci na parada mais próxima do meu destino e segui a pé. 
 
Sempre que isso acontece percebo que as pessoas que passam por mim (motorizadas, claro) ficam me olhando. Tenho certeza que não é por causa desta minha “beleza escultural”, afinal não me enquadro nos padrões da dita cuja.  Ontem, como o sol estava ameno (coisa rara em minha cidade de sol escaldante) e eu andava um pouco mais lento tentei entender por que me olhavam tanto. 
 
Ao atravessar a rua no primeiro sinal percebi que os motoristas me olhavam com cara de surpresa. Fiz uma rápida vistoria na roupa, todos os botões estavam fechados, portanto o motivo não era um descuido de uma senhora de cabelos grisalhos andando sozinha pelas ruas. É espanto mesmo.
 
Ao passar por uma construção vieram os conhecidos assobios e aqueles “elogios*” que mais parecem um tapa na cara. Fiz-me de surda e segui em frente. Quando me aproximei da borracharia o funcionário dirigiu-se a mim e foi logo perguntando: o carro da madame está aonde? Eu também gostaria de saber, respondi, deixando-o tão surpreso quanto eu fiquei ao ser interrogada por ele.  Ri sozinha e segui cantando (baixinho, é claro) ou pensando alto. 
 
O próximo a cruzar por mim, de moto, quase passou por cima de um meio-fio por estar olhando de lado, talvez tentando entender porque eu estava rindo sozinha. O que era um riso discreto transformou-se em gargalhada. 

Ao passar pelo posto de combustível os frentistas me olharam com uma cara tão engraçada que, mais uma vez fui obrigada a rir. Eles balançaram a cabeça com uma expressão que parecia dizer: "ela é maluca". Um senhor que estava parado esperando o ônibus ao me ver seguindo a pé gritou: senhora, cuidado, a senhora vai ser assaltada. Fiz um sinal afirmativo com o polegar e segui. Ele ficou resmungando. 
 
O ciclista que passou quase raspando em mim advertiu: tia, tenha cuidado, tem muito malandro solto por ai. Pronto, entendi, estão todos preocupados com minha segurança. Se nossos gestores estiverem tão preocupados quanto estes gentis cidadãos logo teremos solução para os problemas de segurança de nosso "País de Mossoró". 
 
O restante do percurso transcorreu em paz. Cheguei ao meu destino inteira e em segurança. E podem acreditar, não estava botando "os bofes pela boca"; apesar de não fazer exercícios físicos ainda aguento uma boa "andada", não sei quantos metros me separam da parada do ônibus ao meu trabalho, ando com o velocímetro desligado, mas posso afirmar que continuo em forma para andar a pé.




1*. Mais aprumada que meio fio. 
2*. Eita da coroa enxuta.
3.* Essa ainda dá um caldo (essa é a pior de todas, dá vontade de jogar um tijolo em agradecimento)
Ângela M Rodrigues O P Gurgel
Enviado por Ângela M Rodrigues O P Gurgel em 27/06/2015
Reeditado em 06/09/2018
Código do texto: T5291956
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