SILOGISMO MODERNO

Podemos raciocinar ou argumentar logicamente, fazendo uso da dedução, da indução ou da analogia. Nessa crônica abordarei apenas a primeira, pois se Aristóteles (o pai da Lógica) souber que eu ando parafraseando as suas ideias, certamente, se revirará no túmulo e virá puxar minha perna esta noite.

O fato é que uma inferência/dedução deriva da estreita inter-relação existente entre uma proposição geral (premissa maior) e uma particular (premissa menor), desde que ambas sejam verdadeiras. Para entender melhor, observe o exemplo a seguir:

Todo brasileiro é sul-americano. (Premissa maior)

Ora, todo capixaba é brasileiro. (Premissa menor)

Logo, todo capixaba é sul-americano. (Conclusão)

A dedução acima é verdadeira, mas nem todas elas são assim, há também as falaciosas e as sofismáticas. As características das primeiras são a sonseira ou a inocência, e das segundas é a maldade mesmo. Creio, porém, que estamos inaugurando um novo tipo de dedução, analisando o fato acontecido, recentemente em um hospital, e que passo a narrar agora.

“Olha só como ele está bem! Logo, logo estará em casa para a felicidade de toda a família. Ah, e o mais importante, em muito boas condições de saúde, já que a tendência do diabetes é sumir após esse tipo de cirurgia!”, disse a doutora, olhando, ora para o paciente que se convalescia de uma bariátrica, ora para o senhorzinho que ela encontrara na entrada do hospital, procurando por um filho. Julgando ser o pai do primeiro, abraçou-o carinhosamente e o conduziu ao quarto, já que estava mesmo indo fazer-lhe uma visita.

Enquanto a doutora (falante como o quê!) ressaltava a semelhança entre ambos, perguntava pela sua esposa e discorria sobre os cuidados pós-cirúrgicos imprescindíveis; o paciente, com os olhos mortiços de quem acorda de uma anestesia, olhava atentamente para o visitante, buscando traços comuns que identificassem o possível grau de parentesco existente entre ambos.... Talvez fosse um tio ou um primo distante....

Já o humilde senhorzinho tinha um olhar desesperado, aquele mesmo que temos quando queremos muuuito ir ao banheiro. Mudo e atordoado diante da fala alegre e ininterrupta da médica, o velho senhor parecia querer que ela saísse da frente da porta para que ele a abrisse e sumisse. E Deus ouviu suas preces!! Enquanto ela foi até o leito conversar apenas com o paciente, o homem abriu a porta e desapareceu!

Neste instante, sua filha, acompanhante, que a tudo assistia, perguntou: “Pai, quem é este moço? Por que ele saiu correndo? E ouviu como resposta o seguinte: “Nunca vi mais preto!! Sabe Deus!!”.

“O quê? Aquele senhorzinho não é seu pai, não? Eu seria capaz de jurar que era? Ele é a sua cara!!”, falou a médica.” Ao que o operado reagiu de chofre, fingindo indignação: “O quê? E eu sou feio assim? Muito obrigado, doutora”.

A resposta foi um riso frouxo, contagiante e que se manifesta até hoje.

Mas, eu cá com meus botões, assassinando as regras do silogismo aristotélico, continuo montando um monte de premissas aleijadas, na tentativa de entender a dedução, que originou esse episódio. Estou presa, porém, na palavra maiúscula abaixo:

Todo mulato é irmão um do outro;

Ora, o paciente é mulato e tem pai;

Ora, o senhorzinho é mulato e tem filho;

Logo, o senhorzinho é PAI do paciente.

NORMA ASTRÉA
Enviado por NORMA ASTRÉA em 30/06/2015
Reeditado em 30/06/2015
Código do texto: T5294738
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