Por um melhor exercício da humanidade

O debate que muito tem mobilizado o povo brasileiro, seja nas redes sociais, seja nas rodas de conversa, é a redução da maioridade penal, tema este que tem gerado debates que se resumem, na maioria dos casos, a gritos vazios que nada dizem, não havendo discussão racional sobre o tema, o que certamente não trará conclusões acertadas acerca das questões sociais que implicam no assunto.

Primeiramente, é necessário analisar o fato de os presídios brasileiros não cumprirem sua função - definida em lei - de ressocializar o indivíduo para que, quando liberto, não volte a cometer crimes, entrando em harmonia com a sociedade. Ou seja, a prisão brasileira não faz amadurecer o indivíduo por meio da educação e do crescimento profissional, mas potencializa uma personalidade doentia ao colocá-lo em contato com presos ainda mais perigosos num ambiente desumano e promíscuo, o que tende a revoltar ainda mais aquele que violou a lei, não deixando a ele outra escolha senão fugir e voltar a delinquir. Os números estimados pelo Conselho Nacional de Justiça nos últimos anos confirmam tal fato: 7 entre 10 presos adultos cometem novos crimes quando em liberdade.

Não é possível aceitar o encarceramento de jovens de 16 anos tendo em vista tais consequências. Para entender o quão desastroso seria isso, basta saber que o índice de jovens que voltam a cometer crimes após passar pelo tratamento previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente é reconhecidamente menor (a Fundação Casa, que presta auxílio a jovens de 12 a 21 anos no estado de São Paulo, divulgou, em 2010, que tal número equivale a aproximadamente 1 em cada 10 jovens). Ou seja, apesar de possivelmente não ser tão eficiente em todos os cantos do país, a internação ainda funciona melhor do que a prisão para tratamento, exatamente pela forma como são tratados aqueles que vão para as respectivas instituições.

Mas é necessário ir além: a mídia possui meios para espalhar o medo e o ódio entre aqueles que recebem as notícias, tendo por trás de cada sensacionalismo interesses diversos. Assim, vemos que grande parte dos argumentos favoráveis à punição mais rigorosa dos delitos consideram o crime como um fato. O crime não é um fato, um mero acontecimento, mas consequência de uma estrutura familiar e, portanto, pessoal, abalada. Numa análise do passado daquele que comete crimes, é possível encontrar abandonos que causam danos irreversíveis. Pois o Estado brasileiro, apesar de ter efetivado inúmeras garantias aos seus cidadãos nos últimos anos, ainda não alcançou a todos. Então é possível questionar se o indivíduo que não teve qualidade nos elementos básicos necessários para formar sua personalidade - educação, saúde, moradia, cultura, lazer etc. - além de possuir uma família ausente, encontrando referências pessoais às vezes no mundo do crime, é passível de uma punição mais severa.

De fato, os seres humanos não devem ser rotulados por seus atos, mas devem, no mínimo, ter o direito de alcançar seu desenvolvimento enquanto pessoas.

Assim, é possível encontrar outro assunto pertinente sobre o tema: qual é a predominância étnica no sistema carcerário brasileiro? O Ministério da Justiça, ao fim do ano de 2014, divulgou que 60% dos presos no país são negros e, em maioria, pobres. Diante de tal número, é possível enxergar quais indivíduos serão alcançados pela redução da maioridade penal: negros e pobres de uma sociedade que mantém em seu espírito a mácula da escravidão, visto que, desde a abolição, são esses os indivíduos marginalizados nas grandes cidades, são esses os que possuem dificuldades em encontrar garantias para o desenvolvimento pessoal, visto que até pouco tempo tínhamos um Estado negligente que só ampliava as desigualdades. Afinal, não é do interesse de muitos poderosos dar direitos a pobres e negros que não lhes trarão lucro. É muito melhor lançá-los no cárcere, gerar ódio contra eles e dizer à população que foi feita justiça, pois investir na educação dessas pessoas certamente não trará resultados no curto período de um mandato político, durante o qual é necessário mostrar trabalho.

Então, conclui-se que a prisão não cura, não salva nem liberta. Mas é possível lutar e ter voz a favor de políticas educacionais que alcancem nossos jovens, os quais, quando cometem atos que ferem as normas de convivência social não ficam impunes, mas são direcionados a uma internação para trazer à tona a sensibilidade daquele ser humano que, apesar de tão jovem, feriu a sociedade com seus atos. É necessário que pensemos além do crime, buscando a recuperação de um cidadão que poderá voltar às ruas muito pior, mas poderá, também, ter novos horizontes para exercer sua humanidade.

Ronaldo Junior
Enviado por Ronaldo Junior em 15/07/2015
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