LEMBRANÇAS DE CASAMENTO

Interessante essa coisa de as pessoas gastarem dinheiro para mandar fazer graciosas e/ou significativas lembrancinhas e dá-las aos convidados em seus ritos de passagens: batizados, aniversários, casamentos, bodas e até missas de sétimos dias, apesar de quase ninguém as guardar.

Buscando saber a origem desse costume, resolvi fazer uma pesquisa e descobri que ele nasceu com as festas de casamentos, pois essas representam a criação de mais uma família e o aumento de prole, o que são considerados dádivas divinas. Então, demonstrando agradecimento e generosidade, os noivos e suas famílias, teriam resolvido dividir a sorte com a comunidade e, assim, surgiram os banquetes e as festas.

As lembrancinhas teriam nascido no século XVIII, quando a tradição mandava presentear os convidados com amêndoas: as noivas preparavam saquinhos com cinco delas e os davam às convidadas, desejando-lhes sorte, fertilidade, riqueza, longevidade e saúde. Do jeito como o conhecemos hoje, o ato de oferecer lembranças aos convidados de um casamento nasceu no século XIX, representando a gratidão dos noivos pela presença do convidado e sua contribuição dada para o início da vida do casal.

De lá para cá, as lembrancinhas passaram a ser ofertadas nas demais festas ou comemorações com o sentido fazer com que o convidado, ao chegar à sua casa, ainda se lembre da festa a que compareceu, saboreando-as ou colocando-as para enfeitar algum móvel. Mas nem sempre os presentes são coisas materiais, como você descobrirá a seguir, caro (a) leitor(a).

Ao longo dos mais de trinta anos em que tenho atuado na educação como professora, diretora ou coordenadora, tenho conquistado grandes amizades e quase todas elas nasceram do meu profundo respeito aos que lutam, de verdade, para vencer na vida. Uma delas vem da época em que frequentar um curso superior significava trabalhar o dia todo, entrar dentro de um ônibus no final da tarde, assistir às aulas à noite toda, retornar para o referido veículo e ir chegar a casa, muitas vezes, de madrugada: Maria Geralda Araújo Adão.

Lembro-me, perfeitamente, de uma noite de fevereiro de 2002, quando a vi pela primeira vez. Recepcionando os calouros do curso de Letras, Português/Espanhol, eu li para eles uma mensagem cujo tema central era a persistência. Falava de um piloto que, ao conduzir uma aeronave, descobriu que ela estava enfestada de ratos. Em vez de se apavorar, ele arremeteu-a para o alto, pois sabia que os roedores não aguentam alturas.

Em seguida, ao tentar descobrir um pouco sobre a vida dos ingressantes, soube que aquela aluna morava em Conceição da Barra. Com o passar do tempo, descobri que Geralda lecionava para crianças nos dois horários, que saía correndo do último emprego para tomar uma condução que a levasse até a BR 101, onde ela normalmente tentava uma carona, ou, quando tinha má sorte, esperava passar um velho ônibus amarelo (o “Bob Esponja”), proveniente de Pedro Canário. Durante quatro anos, muitas vezes, ela teve dificuldades para chegar à Faculdade e também para repousar em paz as poucas horas que lhe restavam antes que a labuta recomeçasse.

Descobri, certa noite em que passou muito mal, que ela sofria do coração. Aprendi a admirá-la, muito mais, pelo seu esforço, pela sua perseverança, e passei a chamá-la, simplesmente de Gê. Muitas vezes ela me disse que pensou em desistir, mas lembrou-se da minha fala inicial e encontrava forças na metáfora em que o piloto voava mais alto para exterminar os ratos.

Ao longo desses anos, eu a encontrei diversas vezes e em todas elas os nossos encontros foram como festas, marcadas por fortes abraços e muitos beijos estalados. Assim, quando ela me comunicou que se casaria no dia 18 de julho de 2015, às 17h30min, eu prometi-lhe que estaria presente e assim procedi.

Nessa data e horário eu, num básico pretinho, curto, estava presente ao local do evento: uma chácara linda, com um gramado muito verde, um tapete vermelho, um altar bonito, cadeiras e mesas com toalhas muito brancas... Tudo estaria perfeito se não fossem os mosquitos, ou muriçocas, ou maruís, ou borrachudos, ou todos eles juntos, terem encontrado os peitos dos meus dois pés, minhas duas canelas, coxas e braços roliços, além das imediações do pescoço e das costas. Graças a Deus, uma outra querida egressa do curso de Inglês, presente, Deijane Santos Ribeiro, conseguiu um frasco de repelente, que consumimos rapidamente.

Por volta de 19h e 30min, Gê pisou o tapete usando um vestido imaculadamente branco, estampando um sorriso enorme para os convidados e muito luminoso para o seu futuro marido, Nivaldo. Após a cerimônia e o jantar, pude beijar muitas vezes o seu rosto e desejar-lhe uma longa e feliz união. Na hora de ir embora, ela me deu uma linda caneca como lembrança de seu casamento. Eu a trouxe e expus, com muito carinho, na prateleira onde ficam as homenagens que já recebi em minha vida.

Não sabia eu que, além do presente dado por minha amiga, eu trazia em meu corpo outras lembranças, que acordaram tão logo eu tomei banho e o efeito anestésico ou antimicótico do repelente passou: dezenas de picadas. Aliás, é por exigência delas que eu encerro essa crônica, já que meus dedos e unhas acabam de ser requisitados para esfolá-las, com foooorça!!

NORMA ASTRÉA
Enviado por NORMA ASTRÉA em 23/07/2015
Reeditado em 31/10/2017
Código do texto: T5321186
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