Minha Infância

Quando era criança, lembro de morar em uma casa, na qual o quintal dava fundos para uma linha férrea, lembro pois, os apitos do trem e o barulho que fazia ao passar, ficaram gravados na minha memória, e lembro ainda que corríamos eu e meus irmãos para ver o trem se afastando linha afora. Quando tento voltar no tempo e lembrar de algo mais, ouço, os gritos de uma vizinha que chamava uma menina todas as tardes para escolher o feijão, ela gritava:

- Ô Escuí, vai escolhe o feijão! Ô Escuí, vai escolhe o feijão! E ficava assim a gritar até a garota obedecer e ir escolher o feijão. Engraçado, como coisas assim, não saem da lembrança, quando retorno a este local em pensamentos, lembro do trem, da linha férrea e da casa da vizinha aonde morava ela e a garota a qual chamava de Escuí, nunca fiquei sabendo o porquê. Acho que entrou para a lista das minhas curiosidades não satisfeita. Essa história merece entrar para a lista das minhas histórias de recordações de lugares que devam ser associados as músicas, mas, não lembro de ter associado este local a nenhuma música do momento, talvez ainda não tivesse essa curiosidade inter relacional ainda, pois, era muito pequena. Outra ocasião lembro que morava em um bairro da zona norte de São Paulo, se não me engano, era Jardim Parada Inglesa, e também era pequena ainda, tinha por volta de oito anos de idade mais ou menos, e minha casa era de telha de barro, com forro bastante velho e que havia alguns buracos no forro de madeira, havia portanto muitas lagartixas que principalmente à noite passeavam pelos forros e pelas paredes da casa, principalmente em época de calor, parece que elas ficavam ouriçadas à cata de mosquitinhos e teias de aranha e baratas, época que parece que todos esses insetos saem da toca, um dia já de noite fui em direção ao filtro para pegar água para tomar, em frente ao filtro ficava um copo e assim, abri a torneirinha e a água começou a encher o copo, lembro que peguei o mesmo e levei à boca, como estava no alto, pensei que a lagartixa estivesse na parede e levei o maior susto quando ela se mexeu no fundo do copo, atirei o copo longe em direção a parede e sai gritando de horror, penso que nunca mais esquecerei este fato, e ainda nesta casa, lembro que cuidava de um jardim para a vizinha de frente, ela tinha uma casa enorme e contratou-me para regar suas plantas, eram muitas, desde vasos que ficavam no alpendre que era comprido e acompanhava a extensão da casa de fora a fora, além dos jardins com diversas plantas e flores, assim, tinha a incumbência de regar todas as manhãs as plantas da dona Catarina, aliás nem o nome dela eu sabia pronunciar direito chamava ela de dona Cataia, as vezes saia Caia mesmo, e com os trocados que ela me dava comprava doces para mim e para meus irmãos, são lembranças que a gente não esquece jamais, e também nessa época, lembro que minha mãe passou mal um dia e como não tinha com quem me deixar, deixou-me na casa do vizinho debaixo que moravam em um lindo sobrado, eram três irmãos e seus pais, mas, não conhecia os chefes da casa, somente os três irmãos, uma era a Rosemary, a moça caçula, a outra era a Iolemari, a filha mais velha e o outro era um rapaz do meio que se chamava Otávio e gostava de tocar violino, ele vivia treinando no violino, assim eu e meus irmãos colocamos o apelido nele de "Otávio o violino", assim, mamãe deixou-me com eles, e não sei dizer com quem ficaram os meus dois irmãos, o mais velho Luiz Henrique e o mais novo Júnior, eu era a segunda filha, única mulher, lembro que essa ocasião minha mãe estava grávida do quarto filho, e assim ela passou mal e teve que ser socorrida, não fiquei sabendo como foi, apenas que deixou-me com esses vizinhos e assim, tomaram conta de mim, aquela noite até a manhã seguinte, eles foram muito gentis e amáveis comigo, nunca esquecerei também a bondade desses três irmãos, são lembranças que a vida deixou como marcas de uma infância de uma família pobre da periferia de São Paulo.

De Vera
Enviado por De Vera em 26/07/2015
Reeditado em 13/09/2022
Código do texto: T5324645
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