O dia não me lembro, o mês deve ter sido setembro ou outubro. O ano: 1978. Estávamos no corredor do Centro de Treinamento do BACEN, esperando para entrar em uma das salas de aula, de onde deveríamos sair "preparados" para o exercício das atividades ambicionadas pela maioria dos jovens que ingressavam no mercado de trabalho: ser servidores da instituição maior do Sistema Financeiro Nacional. Aldo Justo, Itainimá, eu e alguns candidatos aprovados no concurso público federal disputadíssimo observávamos e éramos o tempo todo observados de uma forma que incomodava. Era visível que estávamos sendo submetidos a rigorosos testes, desde o vestir até o falar, gesticular. Avisaram em sala que aquele era um curso de ambientação, ao fim do qual alguns poderiam ser considerados inaptos. Rimos e comentamos que aquilo era ridículo. Afinal havíamos atingido a nota necessária para preencher a vaga. Ali foi o primeiro momento, a primeira troca de palavras e o primeiro gesto afinado, que iriam se transformar  em uma amizade repleta de trocas maravilhosas. Depois de alguns anos perambulando pelos vários departamentos do Banco -  ele muito mais do que eu - eis que nos reencontramos em uma mesma sala, onde executaríamos tarefas semelhantes por dez anos, sob a mesma coordenação, com a qual simpatizávamos ou confrotávamos por motivos iguais. Muitas vezes, saímos dali para o bar, para casa, para um café. Ele tomava bebidas destiladas, eu não. Falávamos pouco. Não era necessário mais. Fazer companhia um ao outro bastava. Às vezes ele lia Fernado Pessoa para mim, noutras falávamos de amor, de amores, de filhos e da chatice que era ter que cumprir horário, tolerar certos chefes, certas regras ( imbecis!), falávamos de músicas, de Chico, de Vinicius, do grupo Liga Tripa que surgia com uma proposta nova, de como se faz um violão. Um dia, fui nomeada Coordenadora. Chamei-o para "trabalhar" comigo. Ele optara pela jornada de seis horas corridas e estava "de saco cheio, com vontade de cair fora". Como era eu quem controlava o ponto, deixei-o livre para chegar e sair quando quisesse.  "Melhorou, Sandrinha. Obrigado." 

+Ita Catta Preta, que saudades!
Obs.: 
Hoje eu estava reorganizando meus papéis, livros, agendas e encontrei essa pérola, que é uma poesia escrita de próprio punho pelo meu querido amigo Ita (artista, músico, poeta, artesão), que se foi ainda jovem, deixando  sua marca inconfundível na Terra. (Sandra Fayad)
 
Sandra Fayad Bsb e Itainimá Catta Preta
Enviado por Sandra Fayad Bsb em 28/07/2015
Reeditado em 04/12/2015
Código do texto: T5326850
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