TAMBÉM QUERO MEU PIXULECO

Um influente político entra na sala de um famoso doleiro, o cumprimenta rapidamente, antes que lhe seja oferecida a cadeira senta-se e no momento quando ia perguntar qual o motivo da ilustre visita, o parlamentar interrompe novamente o visitado e já vai logo dizendo:

- Sem delongas, companheiro, ande logo, estou apressado, tenho muitos compromissos como deves saber.

O visitado sabia sim do que se tratava, mas se fez de desentendido, queria que o visitante fosse mais claro em suas pretensões.

- Mas, Vossa excelência, não sei do que se trata.

- Como não sabes, e os contratos com as empreiteiras que aprovei sem licitações, os projetos aprovados que votei do jeito que o outro grupo queria, é ´´pixuleco.`` é disso que estou falando, eu quero minha parte, eu tenho direito, vamos ligeiro com isso.

Depois de expor estes argumentos com toda autoridade que tinha, o político começou a esfregar rapidamente os dedos polegares e indicadores um no outro e antes que o doleiro dissesse algo mais, pronunciou pausadamente:

- P-I-X-U-L-E-C-O – continuou a esfregar os dedos mais rapidamente e reiterou:

- Agora fui claro? P-I-X-U-L-E-C-O.

- Mas excelência, a sua parte já foi depositada ano passado nas ilhas Caimã, outra parte foi entregue em sua mansão no Lago sul em forma de obra de arte e sem contar as doações usadas para sua campanha.

- Isso tudo aí, foi no ano passado, o que passou, passou, a indústria por aqui não parou de se movimentar e eu também não parei, continuei articulando, também quero mais, ´´vambora,`` também quero meu pixuleco e foi afrouxando o cinto.

O doleiro sabia que seria impossível dialogar e obter êxito, o político estava irredutível, queria porque queria o tal pixuleco e numa vaga tentativa de conseguir pelo menos adiar aquela cobrança, disse ao parlamentar:

- Mas Vossa Excelência, a verba que ainda disponho será usada para financiar a saúde que se encontra praticamente falida, em nosso país.

- Conversa pra boi dormir, meu caro, o país é rico em vegetação, se alguém estiver com alguma coisa, sentindo qualquer dorzinha, é só ir na floresta pegar uma casca ou raiz e tomar, antigamente era assim, pra quê mudar o que sempre deu certo?

O doleiro continuou tentando dialogar.

- Mas meu nobre senhor, compreenda, parte da verba que ainda tenho, será para investir no futuro, será para bancar a educação que no Brasil está uma vergonha, - antes que o visitado falasse algo mais, o político já com o nariz vermelho de raiva, começou a esbravejar:

- O futuro não me pertence, e tem mais, meu senhor, no tempo da palmatória, sem nenhum investimento, a educação funcionava que era uma beleza, que voltem a palmatória e tudo estará resolvido.

- Como vossa Excelência também sabe, ano que vem teremos uma olimpíada, não podemos fazer feio porque o mundo inteiro estará nos olhando, portanto, temos que investir também na segurança pública, que, cá pra nós, está um caos, todo dia a imprensa dispara um arsenal de imagens com gente morrendo vitimadas por assaltos ou porque teve o carro, a moto ou a bicicleta roubados, o senhor pode me compreender?

- Não tenho visto nada disso, é só especulação da mídia que vive inventando coisas para estar sempre em evidência e vender mais, entendeu, meu chapa?

O doleiro como se deu por vencido e certo de que não havia mais nada a fazer, abriu a gaveta, pegou um pacote e quando ia fechando foi interrompido ao ouvir o berro do político:

- E o segundo turno?

Então, mais um pacote foi retirado da gaveta, entregue ao senhor que cobrava, que logo tratou de enfiá-los para dentro da cueca, subiu as calças, apertou o cinto, deu meia volta e saiu rapidamente, ao chegar na garagem, o chofer que já o agurdava, abriu a porta de um luxuoso carro para o chefe entrar e já dentro do veículo o humilde condutor pergunta:

- Para onde vamos, Senhor?

- Toca para o aeroporto, JK

- Sim, Senhor.

- E não me olha com essa cara, que hoje não tenho gorjeta, estou duro.

O carro escuro com placa oficial some rápido, em meio aos prédios da Esplanada dos Ministérios rumo ao Aeroporto JK.

GILMAR SANTANA