Pinceladas Cariocas

Todos os dias, ou quase, ele acorda às 4 da manhã e pé com pé, vai até a cozinha fazer seu café e, já que está com a água no fogo prepara o café dos demais da família, isto é esposa, três filhos e dois netos. Sem fazer barulho vai ao quarto dos fundos trocar de roupas para ir ao trabalho na feira livre. São mais de 50 quilômetros para ir e outros tantos pra voltar. No ônibus lembra que é seu aniversário, mas isso é só um detalhe porque tem anos que não sabe o que é uma comemoração. Os aniversários em sua casa sempre tem bolo principalmente os dos netos.

_“Quando foi a última vez que assoprei uma vela? Ah! Depois de acende a luz quando acabou o blecaute”. – pensou.

Dormiu para aproveitar a viagem.

Na feira vendia suas frutas, conversava com fregueses e naquele dia ganhou alguns presentinhos. No bolso da calça ele encontrou um papel dobrado várias vezes. Pensou que era uma mensagem surpresa de sua esposa por ocasião de seu aniversário como fazia no início do casamento.

“Para: Dé

De: Amélia”

Ao abrir o papel encontra: “Não esqueça a carne seca ponta de agulha da promoção, quero 5 quilos”. Decepcionado devolve o papel ao bolso.

_ Dé trouxemos um presente do nosso sítio, sabemos que você gosta. –o casal de idoso entrega ao feirante uma galinha de olhos arregalados e penas cor de mel.

_ Obrigado. Mas como trouxeram isso do sítio?

_ No carro, veio no colo de Zelda.

_ O problema foi no condomínio essa noite. Ela cacarejava direto, estava estranhando o apartamento.

Dé ficou pensando numa galinha ao molho pardo com arroz, seria uma ótima comemoração de aniversário. A galinha ficou ali na bolsa, deitadinha até o final da feira. De volta para casa, já de tarde, pede a sua esposa que prepare a galinha.

_ Outra galinha dura?

_ Eu gosto de galinha dura.

_ E a carne seca?

_ Esqueci.

Depois de uma discussão Dé vai para o bar de seu amigo Jardel para um bate papo.

Na hora do jantar volta pra casa e não encontra nada especial, nem cheiro de jantar fresco. Todos estão diante da TV assistindo novela. Dé procura pela galinha. Pergunta a umas pessoas fora da casa.

_ Uma cor de marrom? – pergunta um garoto que tentava desenrolar linha de pipa.

_ Essa mesma.

_ Dona Vilma levou pra casa dela.

Dé partiu para a casa do fim da rua. Ao chegar perto sentiu cheiro de penosa na panela.

_ Vilma! – ele grita na porta dela. Ela abre e com um vestido vermelho que saltava aos olhos falou pra ele.

_ Vem comer uma “galinha dura” Dé, no capricho. – puxa ele pra dentro enquanto olha pra todos os lados antes de fechar a porta.

Dé teve o melhor aniversário da vida dele.