Santo Antônio casamenteiro

D. Maria e Das Dores, amigas desde a infância, casaram, tiveram filhos e netos. São aposentadas e pertencem a mesma paróquia. Beatas de carteirinha, fazem trabalhos voluntários e ainda têm tempo para trocar receitas, cuidar das plantas, dos bichos de estimação e de seus velhos maridos.

Diariamente, pela manhã, ambas se encontram para caminhada que se estende da Siderúrgica a Roça Grande. Distância considerável para queimar calorias e colocar as fofocas em dia. Das Dores já não sente mais a labirintite, graças à simpatia ensinada por D. Maria.

Hoje, durante a caminhada, Das Dores estava mais falante, menos queixosa e de passos largos. É que começaram os preparativos para o futuro casamento de sua filha caçula, surgindo então um impasse crucial sobre onde realizar a cerimônia religiosa. O noivo queria tanto que fosse na Igrejinha do Ó, alegando ter conhecido sua noiva numa quermesse bem ali no largo da igreja. Argumentando convincentemente de que a igreja é muito pequena para caber tantos convidados, que somados aproximam quase duzentas pessoas, lembrando que nem mesmo a igreja do Carmo seria possível comportar, optando pela Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição, pois lá fora batizada e fizera a sua primeira comunhão; além do mais foi locação para as filmagens de “D. Flor e Seus Seu Dois Maridos”, lembra?

D. Maria ouvia com paciência os argumentos de uma mãe que só queria que a filha tivesse um bom marido e que pudessem casar em qualquer lugar, percebendo claramente que Das Dores mais queria era desencalhar a última de suas filhas. Após quase uma hora de caminhada, as duas se aproximavam de Roça Grande e avistaram ao longe a Igreja de Santo Antônio. D. Maria de súbito exclamou:

Comadre Das Dores, porque a sua filha não casa na Igreja de Santo Antônio, pois foi pra ele que ela fez a promessa de casamento!

Das Dores ficou boquiaberta como quem quisesse dizer; “eureka!”

Enquanto isso D. Maria insistia em opinar:

São tantas as pessoas que procuram Santo Antônio casamenteiro, fazendo suas promessas, trazendo seus ex-votos, no entanto, são raras as pessoas que escolhem esta igreja para suas cerimônias. Na minha opinião a Igreja de Santo Antônio seria propícia e mais sensato. Além do mais sua filha não arredava o pé de lá, fazendo novena e distribuindo pãezinhos, sem contar as inúmeras vezes em que ela sufocou o santinho no feijão. Foi só arrumar um noivo e desapareceu do mapa. Coitadinho do Santo, deve se sentir subestimado.

É mesmo! Disse Das Dores. Sabe que você tá certa, eu nunca imaginei uma coisa dessa, bem lembrado, comadre! Hoje mesmo direi tudo isto a ela; afinal, casando-se aqui seria uma forma dela agradecer o santo, uai!

E quando será o casamento da sua filha, comadre?

Logo, logo, assim que ela se formar, daqui uns cinco anos, se Deus quiser!

Sergio Pacheco
Enviado por Sergio Pacheco em 27/06/2007
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