O PODER DA COISA (por Marta Cosmo)

William Shakespeare já dizia; “Há mais coisas entre o céu e a Terra do que imagina nossa vã filosofia”. Bob Marley se interpelava: “Deus fez as pessoas para serem amadas e as coisas para serem usadas, por que as pessoas amam as coisas e usam as pessoas?”. Albert Einstein disse que “insanidade é continuar fazendo a mesma coisa e esperar resultados diferentes”. E outro dia ouvi, por onde eu passava, uma música que dizia: “Está faltando uma coisa em mim, e é você amor, tenho certeza!”. Ah... São tantas coisas...
É... Já faz algum tempo que a "coisa" por vezes me faz refletir, outras vezes me incomoda, ou até apavora! Eu não gosto muito da "coisa". Ela se mete em tudo, e mais: quer se apoderar de tudo e até ser tudo. É o tipo de coisa que “se a gente der o pé, quer a mão”, e tudo o que puder. Como “O abutre” de Franz Kafka, a coisa fica à espreita, esperando o momento certo para mergulhar profundamente nas entranhas de qualquer ser, coisa, sentimento, ideia, ou qualquer coisa, e se afogar ”irremediavelmente” em seu ”sangue”, e preencher cada profundidade e inundar todas as margens. Como no filme “A coisa”, e suas versões, a coisa é algo que não se sabe o que é exatamente, mas que se apodera na tentativa de ser o que oportunizar a sua entrada, num simples descuido, ou inconsciência.
Para desvendar a coisa, resolvi, primeiramente, consultar seu significado no dicionário, pois a identificando, exatamente, seria mais fácil entendê-la ou combatê-la, se for o caso. E o que encontrei me causou ainda mais espanto! A coisa é “tudo que existe e pode existir”; “qualquer ser inanimado ou objetos”; a coisa pode ser “um fato real”, um acontecimento; a coisa é “aquilo sobre o que se conversa, se escreve, fala, pensa, etc.” (é essa crônica, então!); “é aquilo que é do seu interesse ou de alguém”; a coisa é “tudo aquilo que não se conhece"; é "um mistério”; pode ser “uma vinculação entre duas pessoas, uma relação”; ou “uma indisposição repentina e indeterminada; um troço”. E é algo que eu ainda desconhecia: “uma palavra-ônibus que pode ser utilizada no lugar de qualquer objeto, fato, acontecimento, sentimento ou sensação etc.”. A coisa pode até se transformar em verbo e, então, a coisa pode coisar! Isso até parece “coisa do arco da velha”. É nesse momento que “a coisa fia fino” e vira “coisas e loisas”. Mas agora não tem mais jeito, ela tornou-se “coisa pública”, e não pode mais se tornar uma “coisa à toa”. Ou pode? Ou o é?
Parece até que já "não estou falando coisa com coisa”. Talvez a coisa, "não seja lá grande coisa", mas é preciso saber das coisas. Por isso, não desisto de desvendar a verdade da coisa, (coisíssima nenhuma!), ainda que vire uma coisama, mesmo que na realidade “a coisa em si” seja uma “coisa feita”, ou possa até se transformar no “coisa ruim”.
Mas o pior de tudo é esse poder que a coisa pode ter: o de coisificar tudo, a chamada “coisificação”. Lembras do mito de Midas? O rei ganancioso que tudo que tocava virava ouro? Da mesma forma, tudo que a coisa toca vira uma outra coisa. Eu sei que tem coisas que merecem ser chamadas de coisa. Mas tudo isso nos faz perceber que fomos inseridos na “história das coisas”, construida pelo Capitalismo, e que por isso querem que acreditemos que o valor está nas coisas e não nos seres humanos. Nesse triste contexto todos os seres vivos em geral são vistos como coisas (coisa sem valor; coisa não humana que não sente frio, fome ou dor). Digamos não a coisificação dos seres humanos, e de tudo que tem vida!
E nesse mundo das coisas, a toda hora nos chega uma ideia de coisa sedimentada que nos dizem pra sermos ou que somos como as coisas. Por exemplo: "seja como a ponte e não como o muro"; "seja como a linha e não como a agulha". Ou frases como a de Friedrich Nietzsche: “O homem é uma ponte suspensa no abismo que liga a besta ao Super-Homem.”, etc, etc, etc. Inclusive eu disse outro dia, numa rede social: “é duro ser pedra”. Despertei. Enfim, “as melhores coisas da vida não são coisas”, frase que li ainda hoje em uma rede social. É por isso que “está na hora de descoisar as coisas que estão coisadas”. Deixo, assim, um alerta: cuidado com o poder da "coisa"!
Rrrrrrrrrrrrrsssssssss!!!!!
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS
AULETE, Caldas. Novíssimo Aulete dicionário contemporâneo da língua portuguesa. Organizador: Paulo Geiser. Rio de Janeiro: Lexikon, 2011.