Fim de Ano

A decoração da árvore de Natal ficou uma bosta. As luzes do ano passado estavam quase todas queimadas. Não compramos novas. Montamos sem vontade. Apenas porque a mãe insistiu. Apenas para manter as aparências. Quando havia crianças na família todos esforçavam-se mais para fingir que tudo estava bem.

Durante o ano, divórcios, traições, desavenças entre irmãos, morte de parente próximo, gravidez indesejada, falência de órgãos, câncer, sífilis, dívidas. Mas no Natal, os adultos engoliam a raiva, as tristezas e as mágoas para que as crianças não sentissem o clima de merda e tivessem boas lembranças.

Depois que crescemos todos, isso não era mais necessário. Os velhos estão cada ano mais ranzinzas. Deveríamos agradecer a Deus de terem durado tanto e terem saúde suficiente para passar os dias resmungando, retrucando, esfregando porcarias do passado na cara um do outro e nos ligando para se meter em nossas vidas. Porém, agora eles não têm mais por que se conter diante dos filhos e usam as poucas reuniões de família para provocações e para remoer o passado.

A gente não tem mais saco para o Natal. Se algum dos irmãos fizesse um filho, talvez tivéssemos algum motivo para fingir que tudo está bem novamente.

Lucrécio de Souza
Enviado por Lucrécio de Souza em 11/12/2015
Reeditado em 11/12/2015
Código do texto: T5477348
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2015. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.