A prostituição nossa de cada dia

Na semana que se passou li uma frase na rede social que não identificava o autor. A frase é a seguinte: "O emprego é a prostituição mais antiga do mundo." Tanto concordo com ela que já tive a oportunidade de repeti-la em uma conversa.

Hoje, eu voltava do trabalho para casa fumando um cigarro, a pé, no centro de São Paulo, precisamente naquele pedaço onde a prostituição substitui os comércios que fecham as portas às seis da tarde. Me vendo vir pela calçada, uma moça em trajes de festa sai de um bar e se põe no meu caminho.

- Ei, você pode me arrumar um cigarro?

- Só tenho este que eu comprei solto ali na banca. - Respondi, já puxando um gancho para encerrar a conversa - É que eu estou desempregado!

Imaginei com esta última frase que ela desistiria por completo do seu intento, pois geralmente as prostitutas se aproximam pedindo um cigarro apenas como forma de iniciar um diálogo, para oferecer os seus préstimos profissionais, uma estratégia da profissão. Logo, esta sabendo que eu não era um cliente em potencial, desistiria.

Ela porém, queria mesmo conversar um pouco, e acabou me pedindo o fogo. Tirou um cigarro da sua bolsa e se apresentou como prostituta, disse que a situação estava mesmo difícil, que se prostituía porque não arrumava outro emprego. Disse que nunca tinha sido pobre, mas que precisava sobreviver e enfrentava muito julgamento, mas ajuda mesmo, nenhuma de ninguém.

Eu então, resolvi esclarecer para ela que eu não a julgava mal por sua profissão, pois no meu entender, praticar atos libidinosos por dinheiro pode ser uma forma honesta de subsistência. Algumas prostitutas são profissionais verdadeiras, e exercem seu ofício com dignidade.

Comparei ela ao resto da sociedade, mostrando-lhe que qualquer pessoa que se presta a realizar um trabalho que detesta, as pessoas que odeiam seus chefes e os bajulam, as esposas que se casam apenas por dinheiro com maridos violentos. Se prostituem também, ou não? Não seriam estas, mais dissimuladas que as prostitutas profissionais, as que saem vestidas a caráter, que assumem seu ganha pão abertamente?

Porque nossa sociedade é toda uma grande zona, um puteiro imenso que até tem luzes vermelhas, mas que se olhado de longe é uma bola azul no Universo.

Nesta grandíssima casa de lenocínio, a grande maioria dos habitantes é a carne, o mercado de trabalho está saturado de vagas desgraçadas, de funções malditas, de atividades que ninguém gostaria de fazer.

Disse bem Cazuza em uma canção "transformam o país inteiro num puteiro pois assim se ganha mais dinheiro", frase que eu acredito ser verdadeira em qualquer país, por mais organizado que seja. E ainda mais na globalização. O fato, é que somos organizados desta forma, uns vivendo dos esforços dos outros.

Terminei dizendo que ser prostituta é muito melhor do que ser parasita, e que se ela se incomodava da profissão, não devia desistir de mudar, mas que se ela gostasse, que tivesse então orgulho, pois ninguém é melhor que ela.

Então, digo a você, leitor, e repito para mim mesmo, se o seu emprego tira a sua saúde ou a sua paz de espírito, é melhor continuar estudando, procurando outros trabalhos, fazendo de tudo para conseguir sair desta situação. Se ter liberdade é poder escolher, somos realmente livres quando se trata de emprego?

Sobreviver é uma atividade que dá trabalho, mas vida é muito curta, e às vezes, a aposentadoria nem chega.

Ricardo Selva
Enviado por Ricardo Selva em 18/01/2016
Reeditado em 18/01/2016
Código do texto: T5515494
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2016. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.