Escritora Anajá Caetano
 
Luiz Carlos Pais

 
A escritora paraisense Anajá Caetano, neta de escravos africanos, tem seu nome na história da literatura brasileira, como autora de um romance histórico, ambientado nas fazendas de café do município de São Sebastião do Paraíso, no sudoeste mineiro, nos últimos anos do longo período de escravidão. Esse romance, intitulado Nega Efigênia, paixão do senhor branco,  foi publicado em 1966 pela editora Edicel, de São Paulo.

No ano de lançamento da obra, a autora paraisense residia na capital paulista, na Avenida Bosque da Saúde, próximo a Praça da Árvore. Exatamente nesse local, há mais de 50 anos, funciona a Banca de Revista do meu tio Vicente Lizarelli, irmão de minha mãe Terezinha Lizarelli Paes. Sempre quando vou a São Paulo, procuro visitá-lo, pois, além do mais, a Banca de Revista é um ponto de encontro de paraisenses que moram naquelas imediações. Nesse local, conheci a poetisa Adélia Victoria Ferreira, ex-presidente da Casa do Poeta “Lampião de Gás”.


Anajá Caetano esclarece na introdução do romance que ela era neta de escravos descendentes da etnia Quioco, vindos de Angola, e foram trabalhar nas fazendas do município de Paraíso. Após a abolição da escravidão, seus avôs foram morar cidade. Ainda na infância foi morar na casa do escritor e advogado José de Souza Soares, a quem considera seu pai de criação e agradece por ter lhe ensinado o gosto pela leitura e pelas histórias da terra natal.

Autor da primeira obra histórica de São Sebastião do Paraíso, publicada em 1922, Souza Soares era genro do coronel José Cândido Pinto Ribeiro, intelectual, músico, escritor e poliglota. Foi nesse ambiente de valorização da cultura, onde aflorou a expressiva produção literária do ilustre escritor paraisense, que a escritora autoditada teria passado sua infância e adolescência.


Alguns anos depois que foi morar em São Paulo, onde criou suas filhas, conseguiu finalizar a redação do seu conhecido romance histórico, cujos personagens foram inspirados nas antigas histórias contadas pelo seu saudoso pai de criação. Na capital paulista, Anajá Caetano tornou-se militante de organizações sociais que atuavam em defesa dos homens de cor.

Ficou conhecida de políticos, líderes do movimento negro e de embaixadores africanos. Soube mostrar, através de sua obra, com leveza e serenidade, aspectos marcantes da cultura e da sabedoria dos povos africanos, preservando traços da memória de seus ancestrais. Vem daí também o interesse dos  especialistas que analisaram sua obra que registra traços antropológicos da cultura negra, além da qualidade literária típica do romance histórico.


A escritora soube com maestria desvelar parte da crueldade existente na sociedade escravocrata dos últimos anos do período imperial. Também foi pioneira em mostrar traços da miscigenação e influência da cultura negra na sociedade brasileira. O ambiente acolhedor em que passara a infância deixou mil histórias gravadas em sua memória. Sem confundir história com romance histórico, sua produção foi generosa em preservar lembranças de gestos abolicionistas que ecoaram nas fazendas de São Sebastião do Paraíso. O valor de sua obra não pode ser confundido com os princípios exigidos na produção historiográfica.

Entretanto, várias passagens do romance merecem atenção por parte dos interessados pela história da escravidão, sobretudo, nos momentos finais do mais insano dos sistemas de produção. A importância da obra de Anajá está confirmada em trabalhos acadêmicos como resenhas, dissertações e teses de doutorado que tratam da produção literária de autores afrodescendentes.