FINITIZANDO O INFINITO

A maior e mais infame das doenças humanas é o orgulho.

Dele derivam a prepotência, arrogância, egoísmo, elitismo, corporativismo, nacionalismo e outros tantos ismos divisionistas, além de preconceito, homofobia e mais disparates.

Por conta desse orgulho tolo, em todas as eras da história conhecida, sempre fizemos e dissemos coisas estúpidas, crendo que fazíamos e dizíamos maravilhas. Já produzimos várias guerras em nome da paz, escravizamos com o aval e a benção das autoridades religiosas, dividimos o mundo em centenas de fronteiras, apregoando ideais solidários, envenenamos rios, lagos, oceanos, enquanto discursamos e publicamos mídias de preservação ecológica, e ainda cremos que os fins justificam os meios. Isso quer dizer que se tivermos de destruir, esgoelar, trucidar, devastar, mentir, desprezar ou eliminar, para obter a vitória, não há problema.

Somos grotescos, primários, brutos, com apenas um vernizinho mínimo de civilização.

A concepção técnica de nosso corpo e mente é fantástica, e bem pouco compreendida ainda, mas nossos procedimentos, o uso compartilhado de emoção e razão (desequilibrado, é bom que se diga) ao nosso bel prazer, por conta do livre arbítrio, só resulta em desastres. A cada passo positivo, progressista, descobridor, inventivo, seguem-se milhares de outros tristes, violentos, destruidores, retrógrados, que se impõem e se estabelecem como dominadores.

Nada disso é novidade, e mesmo que a maioria ainda prefira se intoxicar com bebidas, fumaças e químicos diversos, gritar pelas ruas, brigar, xingar e desrespeitar todos e tudo, só para se fazer valer, do mesmo modo como se procede nas tribos mais primitivas do planeta; há uma minoria que permanece silenciosa e atenta ao que acontece no mundo, tentando agir com mais bom senso, e conhece bem o que aqui escrevo.

Há, porém, um outro viés do cenário problemático que criamos e nos envolve, derivado de nossa loucura, a partir do orgulho. Entre os humanos menos embrutecidos, que se dispõem a estudar, pesquisar, intuir, consagrar-se a abrir fronteiras de conhecimento, frequentemente há os que, mesmo imbuídos de ideal superior, acabam traídos pelo ego, confundindo tolices com conhecimento, personalizando o que deveria ser genérico e padronal, mitificando o que teria de ser desmistificado e fantasiando, ao invés de se ater à realidade fria dos fatos.

Entre os cientistas e historiadores (que não deixam de ser cientistas), isso ocorre com mais frequência, em parte porque o ambiente acadêmico tende a tornar o estudante arrogante, elitizado, sentindo-se especial, dominador do conhecimento em que é versado, e também pela necessidade pessoal de crer na casualidade fenomênica, em substituição à existência de um criador onipotente, onipresente, onisciente. O ego prefere não se submeter a um Deus.

É muito fácil, hoje em dia, falar do ego, citar estudos, avaliar performances, criar rotinas e métodos, mas nunca conheci uma pessoa sequer que já não seja mais escrava de seu ego. É claro que muitos declaram ter vencido o desafio, arrotam liberdade e tal, mas na bucha, na prática, no dia a dia, é claramente visível a dependência, a submissão, a subserviência.

Nietzche afirmou, certa vez, que Deus está morto. Outros afirmaram que a ciência tinha chegado ao seu termo, e isso há muito tempo atrás. A cada época, os limites do conhecimento técnico ou gnóstico, desenham um futuro e uma imagem de Deus prováveis. Na hora parece a todos que aquilo faz sentido, mas décadas depois se torna defasado, insólito. Ao invés de usar o erro como aprendizado, repetimos, invariavelmente, a brincadeira, e continuamos indicando o futuro, a estrutura divina, a origem da criação, seu histórico, como se tivéssemos elementos suficientes para entender a realidade ultérrima do universo. Só sendo loucos orgulhosos.

Hoje é comum ouvir falar em bioplasma, experiências genéticas, antimatéria, matéria escura, dobra espacial e artefatos nucleares, como se tais assuntos encerrassem tudo que é possível conhecer e desenvolver, só que ainda são brinquedinhos rústicos, entre civilizações muito mais adiantadas. Mas nós insistimos que Deus e seus prepostos usam tais recursos para estruturar mundos, que pode até existir gente mais evoluída no universo, mas já entendemos muito bem o que esses seres usam, o que sabem. Somos mais espertos, né?

O que somos, e isso deve ficar bem claro: “tolos prepotentes”.

Nem em alguns milhares de anos vamos saber o básico dos básicos. Estamos apenas engatinhando, enquanto outras civilizações voejam por todo o universo. Queremos nos atribuir importância, e até devemos ter alguma (não por nosso mérito), mas tudo que sabemos, seja por ciência, intuição ou memória, é rascunhinho infantil, fantasiado de grande revelação.

nuno andrada
Enviado por nuno andrada em 03/03/2016
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