MACHEZA E HOMBRIDADE

Macho que é macho não apaga a luz. Quebra a lâmpada.

No anedotário comum, nas rodas de conversa fiada, nos bares, botecos, sempre há a conversa mole corriqueira, que envolve brincadeiras diversas sobre o machismo, em seus mais insólitos aspectos; mas também acontecem desafios, exibições e afirmações hostis.

Sempre que há alguma discussão sobre espaços a serem ocupados na sociedade, por homens e mulheres, a divisão entre machistas e feministas se acirra, desaguando em pérfidas alegações, de ambos os lados, quase sempre de caráter destrutivo, desabonador. E quando me refiro a feministas, meu foco não são as mulheres, apenas, mas também os personagens masculinos, que têm sensibilidade suficiente para entender que já passou da hora de dividir as tarefas e ocupações por gênero, de estigmatizá-las como o lado fraco da humanidade, de crer nas bobagens religiosas sobre a culpabilidade primaz das mulheres, em relação a um suposto pecado original, de considerá-las a personificação da tentação, de enxergá-las problemáticas, por estarem sujeitas à gravidez, lactação, menstruação e atenções familiares e, principalmente, de competir com elas, tentando diminuí-las para lograr o próprio engrandecimento.

É claro que o fetiche sexual tem um papel ainda recorrente e importante, no convívio de casais e no entendimento entre parceiros, seja em que situação for; e tal fetiche, em muitos casos, envolve a figura icônica do macho dominante e da fêmea submissa, cujas derivações são múltiplas e quase incontáveis. Ocorre, porém, que isso se resume a uma brincadeira, uma situação fictícia, forjada entre quatro paredes, ou algo que o valha, com a finalidade de divertir e excitar, sem se estender à realidade cotidiana vivida pelos participantes.

Existe um adágio, que cita a preferência masculina pela mulher ideal, como sendo uma prostituta na cama e uma dama na sociedade. Já vi muitas mulheres repetirem tal afirmação como sendo algo a ser seguido ou tentado, para obter o máximo de cumplicidade do parceiro.

Na verdade, não importa o caminho sexual a ser seguido pela pessoa, pelo casal, pelos que se relacionam, assim ou assado. O que importa mesmo, é o entendimento, inequívoco, de que existe uma divisão muito clara entre fantasia e realidade, entre personificação e vivência. A maioria das pessoas (mais homens que mulheres), confunde as situações e acaba gerando as trágicas situações que emporcalham a vida de todas as nações do planeta.

Muitos estudos já identificaram, em épocas remotas da história deste mundo, a grande prevalência do matriarcado, ou seja, a preponderância das mulheres sobre os homens, nas famílias, nos clãs, nas dinastias e no governo de pequenos e grandes reinos. Até mesmo em algumas sociedades primitivas e menos organizadas elas tinham papel relevante e respeitado, mas houve grandes mudanças de conceito, a partir da militarização crescente e continuada dos países em ascensão, alguns séculos antes de Cristo. A adoção de princípios bélicos para gerir povos diversos contribuiu para substituir a resistência feminil pela truculência máscula. Logo a seguir, os núcleos religiosos passaram a preconizar ideias que fossem condizentes com esse estado de coisas, para não divergir dos poderes dominantes, e a bagunça estava formada.

Foram milênios de ações estúpidas, tratando mulheres como uma raça distinta, mesmo que todos os homens viessem delas, atribuindo-lhes problemas e deficiências, até que chegou um tempo, já no século passado, em que as evidências sobre a igualdade dos sexos era tão patente, que ficava quase impraticável ignorá-la. A partir daí, lentamente, elas foram galgando posições na sociedade, demonstrando seu valor e capacidade, ainda levando patadas, virtuais ou concretas, mas enveredando por um caminho que não tinha mais volta.

Hoje vivemos uma situação transitória no mundo, em que grandes conquistas convivem com o achatamento da cultura, o desprezo pelo conhecimento, a elevação do fanatismo e das superstições místicas, em detrimento do esclarecimento filosófico e científico, gerando bandos de mentes vazias, a buscarem o lenitivo das drogas, bebidas, fumo, armas e atitudes torpes, a fim de se projetarem em uma sociedade desestruturada, doente, poluída e mal administrada.

Não duvido que o que há de pior seja extirpado, num futuro incerto ainda, mas enquanto isso temos de ficar atentos aos extremismos, às histrionices; combatendo com inteligência as investidas daninhas da ignorância violenta. É interessante notar que a maioria dos agressores, em todos os lugares e situações são homens, e homens que não entendem a diferença entre macheza e hombridade. Enquanto a atrocidade da primeira predominar sobre a dignidade da segunda, muita tristeza e indignação nossos olhos irão chorar.

nuno andrada
Enviado por nuno andrada em 28/05/2016
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