QUANDO DONA SUNTA MORREU

Hoje ,20 de fevereiro de 2016 completa 29 de falecimento de Sunta Maria Beltrame Lorenzoni.

Este texto escrevo em sua homenagem.

Quando descobriu-se a doença de dona Sunta, ela logo foi internada, submetendo-se a um longo, doloroso e sacrificante tratamento. Fizemos todos os tratamentos possíveis para a época e nossas condições.

Era portadora de um adenocarcinoma uterino, um tipo de câncer agressivo e que não respondia bem a medicação.

Certo dia , após longo período internado em um hospital em Porto Alegre, os médicos acharam por bem dar-lhe alta e mandá-la de volta para descansar em casa. Ela não estava curada, convalescia. Ainda permanecia em seu corpo, então frágil e debilitado o tumor que haveria de tirar-lhe a vida, alguns meses depois.

A mesma doença que a afetava, afetava a todos nós.

Numa manhã de sábado estávamos reunidos em nosso quintal. Ela varria o pátio ao redor como era seu costume. Com a respiração já descompassada e ofegante , seu semblante não era mais o mesmo. A angustia e a aflição, a incerteza e a agonia tornaram-na menos sensível, menos terna. A doença estava vencendo-a. Em seu rosto não cintilava mais a alegria peculiar e as feições maternais da italiana aguerrida que conhecíamos, figurara-se somente a frieza e a descrença na cura.

Fingíamos uma naturalidade que gostaríamos fosse real, mas que em verdade não existia. Procurávamos enxergar aquele sábado como um outro qualquer, dos tantos sábados que passamos juntos. Mas não era. Procurávamos aparentar que tudo estava bem, tentando fazer aquelas coisas que se fazem num sábado de manhã quando realmente tudo esta bem. Uma sensação diferente pairava no ar.

Assemelhava-se a uma bomba relógio a qual ninguém sabia ao certo quando iria acontecer sua explosão. Mas sabíamos, que de forma devastadora, ela aconteceria. Também sabíamos que os estragos não seriam pequenos.

E aconteceu.

Eu nunca consegui apagar da memória a lembrança daquele sábado.

É engraçado, mas nosso cérebro define cores para cada dia. Elas representam o estado de espírito em que nos encontramos. Aquele dia em meus olhos ficara gravado pela cor cinza.

Muitas vezes vivemos em semelhante situação. Procurando iludir-nos com uma realidade que não passa de uma aspiração, um desejo.A qualquer momento pode se desfazer e desnudar uma realidade cruel. Corrói-nos por dentro, com uma dor indefinida que machuca e cala até as últimas fibras da alma.

A bomba explodiu, os destroços demoramos muito tempo para recolher.

Dona Sunta partiu numa sexta feira do mês de fevereiro de 1987

Uma crise derradeira de falta de ar demonstrava que seu tempo estava findando, os intervalos da respiração foram se espaçando até o momento em que despedindo-se deste mundo entregou-nos seu último suspiro.

Pela janela do quarto o sol quente já brilhava alto, indicando a proximidade do meio dia, um bando de pardais teimosos não se cansavam de brincar nos galhos do jasmineiro que exalava seus primeiros perfumes.

A natureza frondosa mostrava sua exuberância e vivacidade. O dia naquela manhã em Santa Maria seguia intrépido como se nada de mais tivesse ocorrido.

Era o dueto vida e morte que seguia seu curso imperturbável, enquanto todos nós limitávamos a assistí-la