A missa de sétimo dia

A MISSA DE SÉTIMO DIA

A tarde caia rapidamente. Inverno, a noite chega mais cedo, deixando nas pessoas a impressão de que o dia acabou antes do esperado. Segunda-feira, um movimento frenético invade a Cidade Maravilhosa, às vésperas das Olimpíadas.

Em minha mente giram as inúmeras lembranças de minha amiga sorridente, dona de dois olhos azuis maravilhosos. O aniversário dela foi há alguns dias. Preciso ligar para felicitá-la. Como resposta aos meus pensamentos o telefone toca. Atendo é a irmã de minha amiga. Uma luzinha vermelha imediatamente acende em meu cérebro. Sem rodeios ela avisa que a missa da irmã será amanhã.

Não consegui me refazer do choque, passam vinte e quatro horas e lá estou rumo à igreja. Lá dentro procuro algum rosto conhecido no meio da multidão. A igreja está lotada. Num canto do lado esquerdo encontro duas colegas do trabalho. Atravesso a igreja e sento ao delas. A missa começa. Rosário, ao meu lado, não para de falar ao celular de cinco em cinco minutos saca o aparelho da bolsa e continua a conversa em voz alta, com alguém do outro lado que está preso em um engarrafamento.

O padre faz o sermão, vem o ofertório, e a Rosário tira mais uma vez o celular da bolsa e engata na conversa. Vem à comunhão e quase nos ritos finais mais uma vez Rosário atende o celular e fala bem alto. Finalmente Tereza conseguiu chegar, está lá na entrada da igreja.

A missa termina vamos até a sacristia falar com os familiares da falecida. Saio da igreja caminhando rapidamente para pegar o ônibus. O bairro que estávamos tem muitos assaltos. É noite fechada. Volto para casa com a sensação que tem alguma coisa errada comigo. Até agora não consegui entender a falta de respeito de algumas pessoas diante da celebração religiosa. Foram os costumes que mudaram? Ou eu estou desatualizada?

Enquanto me pego nesta dúvida, bilhões de outras pessoas no planeta continuam a passar por cima de tudo, como se fosse um rolo compressor na multidão, usando e abusando do celular. Que saudades dos tempos antigos em que missa de sétimo dia era uma forma de se comunicar com Deus através da oração sincera por quem tinha partido.

Nostalgia boa. Talvez eu tenha me enganado e Rosário tivesse a esperança de que a falecida fosse se comunicar através do celular. Enfim, nunca se sabe, de repente, o celular já pode ser usado para falar com outros mundos. Do jeito que as coisas mudam tão rapidamente, tudo pode acontecer, ou não?

Aradia Rhianon
Enviado por Aradia Rhianon em 30/07/2016
Código do texto: T5714226
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