MINEIRO EU?

MINEIRO EU?

“Tem base, sô”?

Perguntaram se eu, carioca da gema, era mineiro.

Se a pergunta tivesse sido feita há alguns anos, certamente teria respondido algo assim:

Mineiro eu?

Mineiro compra bonde de carioca. Depois vende pra paulista, é verdade. Mas compra.

Minas pra mim é apenas passagem de Brasília para o Rio.

Hoje penso diferente e aceito ser confundido.

Tenho muitos amigos de lá. De várias localidades.

Só não sei precisamente de onde são, pois sempre dizem que a cidade das quais são naturais é “pertin, pertin de Belzonte”; “incostadin em Jisdifora”; “duladin de Patos”... e por aí vai.

Chego à conclusão que a cidade de origem do mineiro é sempre aquela perto de alguma outra maior.

Mas, ia dizendo, me confundem com mineiro, porque esta convivência, aliás, para mim, culturalmente muito enriquecedora, me fez assimilar o jeito mineiro de ser.

E mais: me fez sentir necessidade de conhecer, ainda que um pouquinho, aquelas paragens onde meus amigos vivenciaram tantos “causos”, que contam com indisfarçável prazer.

E, cá pra nós, é “bão dimaidaconta” passear por lá.

Afinal tem lá um bocado de “belezura” pra se ver, a começar pelas mineiras, passando pelas cidades históricas do ciclo do ouro e dos diamantes, até as serras e chapadas.

Quem nunca assistiu uma vesperata em Diamantina, conheceu a Ouro Preto e Mariana da Inconfidência Mineira, andou de Maria Fumaça entre Tiradentes e S. João Del Rey, entrou na Gruta de Maquiné, foi ao Serro, a Serra da Canastra, conheceu o Grande Hotel de Araxá, visitou a igrejinha de N.S. do Ó, em Sabará, apreciou as obras do Inhotim, andou pela Estrada Real, foi ver o lobo guará que aparece no Santuário do Caraça, ou simplesmente caminhou pela Serra da Mantiqueira, entre muitas e muitas outras atrações que Minas oferece, tenha certeza, está perdendo muito.

Dizem, o Brasil cabe em Minas. Será?

Não sei se cabe todinho, mas pelo menos um “cadim” cabe. “Cadiquê” lá tem Tocantins, São Gonçalo do Pará, São Sebastião do Maranhão, Conceição das Alagoas, Além Paraíba, Brasília de Minas, Fortaleza de Minas, Icaraí de Minas, Ipanema, Chapada Gaúcha e muitas outras cidades e lugares desse nosso País. Tá tudo lá!

Minas é tão grande que dentro de suas fronteiras tem até Mar de Espanha e Catas Altas da Noruega.

Também é mística: todos os santos por lá habitam, acho até que mais do que na Bahia. Só Santana são umas dez; Santa Rita outro tanto; São João nem dá pra contar; Santo Antonio, outra carrada. Tem Santo de quem eu nunca ouvi falar, mas, curiosamente, Nossa Senhora são só duas ou três.

Tem mais... tem mais! Minas é o único lugar do Brasil em que garantidamente dá pra conhecer um ET. É só dar um pulinho em Varginha. E, ouvi dizer, coladin Belzonte tem um hospital chamado, pasmem, Hospital Matadouro.

MINAS GERAIS, apesar do nome plural é única!!!!

Agora, “bão, mar bão mermo,” é a comida das Gerais.

É típico de lá o frango com quiabo, feijão tropeiro, torresminho, tutu com lombo de porco, doce de leite, pão de queijo, bolo de milho, e por aí vai...

Tão forte é a influência da culinária mineira, que queijo branco no Brasil é “queijo de minas”.

É uma “cumiria” que dá gosto. E pode ”cumê di capitão” que ninguém repara “neca dipitibiriba”. Só de pensar já me dá vontade de “cumê um trem”.

Agora, bebida só tem uma: a cachaça.

A “pinga” mais famosa é a Anísio Santiago, mas é cara “dimais”. Só pra “istribado”, “némermo”?

Vinho, nem pensar. O vinho mineiro é feito de jabuticaba, pêssego, maçã... Qualquer fruta, menos de uva.

Ah... meus amigos de lá me “fizeru” ficar um “pôquim” “mineirim”.

Aprendi muito com eles e sobre eles, os mineiros.

Num poema que li, vi num pequeno trecho o retrato de cada um.

O poema se chama “Mineiro Mineral”, de Sylvio Bazote, e diz:

“...

Mineiro de raiz sabe onde não deve meter o nariz.

Desconfiado por natureza, se não sabe não diz.

Em silêncio observa e medita,

Finge que acredita , desconversa e evita.

...”.

Mas o mineiro é muito mais do que isso.

Clichês à parte, o mineiro é solidário, generoso, amigo...

Dizem que mineiro é aquele que dorme no chão para não cair da cama.

Eu digo que não: mineiro dorme no chão para ceder a cama a um amigo. Já vi isso.

E também não toma café ralo só para economizar o pó. Não! É que ele aprendeu desde cedo que o pó tem que render, porque o café tem que chegar pra todos.

Com tantas coisas boas e pitorescas não dá para negar-se à cidadania mineira.

Então, quando hoje me perguntam se sou mineiro, respondo: não. Não sou, mas poderia sê-lo, porque meus amigos me impregnaram com a mineirice deles e me fazem sentir, ao menos um pouco, o quanto é bom ser “mineirim, uai".

Hegler Horta

2015

Hegler Horta
Enviado por Hegler Horta em 06/08/2016
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