"Cartas de amor ridículas" - (06/agosto/2014) Republicação e poema de Drummond
                                         



 
     Todo ser que ama, todo ser apaixonado escreve ou escreveu cartas de amor ridículas: Fernando Pessoa, a bênção! Por amor se vive cenas patéticas, seres se expõem a julgamentos indevidos, a riscos nem sempre necessários; por amor se engole orgulho, bom-senso, equilíbrio, se preciso; por amor se escolhe nome fantasia e se é desmascarado; por amor... Ah, já fiz tudo isso e mais. Os que são ferrenhos defensores da lei e da ordem não costumam sintonizar muito comigo. Os ferrenhos. Parte deles talvez nunca tenha se apaixonado; outra parte, deveras, "não nasceu para isso"; uma terceira parte nunca ousou "sair do armário". Apesar da dor e da miséria que muitas vezes cercam e mesmo engolem  a condição de amar, os defensores do bom-senso não sabem o que perdem, o que perderam. Decerto, não o sabem. São felizes... como todos, jamais completamente. Os apaixonados também jamais o são, jamais totalmente felizes, (em certos casos, sempre pelo contrário) à exceção de segundos, minutos, algumas horas, alguns dias, que valem por uma vida inteira.  











Nota. Não tenho nada contra os árduos defensores da ordem e do bom-senso. Pelo contrário, eu os respeito. A questão é que, embora eu o tenha tentado, mesmo com afinco, nunca consegui reunir os requisitos necessários para fazer, de verdade, parte do clube deles. E admito: bem o quisera... Ah, bem o quisera... Seria a minha vida tão mais fácil de viver! Não deu... Que pena! Na vida que levo, que sou forçada a levar, a coisa menos conveniente de todas é ser a criatura apaixonada que sou. Miseravelmente, ninguém (por mais que a vida o force e obrigue) consegue tornar-se Uma Inteira e Perfeita Outra Coisa, a coisa adequada, a coisa que convém.







As sem-razões do amor - Carlos Drummond de Andrade

                 Nota. Também em gravação de 2008, no Áudio.




Eu te amo porque te amo,
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.

Amor é estado de graça
e com amor não se paga.
Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.

Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.
Eu te amo porque não amo
bastante ou demais a mim.

Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.

Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.














                              Feliz fim de semana, amigos.