PRATO FEITO

O amarelado da gema do ovo cobria o arroz e o feijão e era tudo o que preenchia a vianda de latão aquecida no fogareiro "Jacaré". Esse era o almoço de Joao. Trabalhador da construção civil. Duas conduções para chegar ao trabalho, local em que chegava sorrindo. Sim, sorrindo, esta era a principal característica do operário, que sentia a felicidade quando no silencio da madrugada deixava no leito, a mulher Lena, morena bonita, e os dois meninos saudáveis e fechava a porta da sua casa, lembrando que a sexta prestação já estava paga. Dorme na primeira condução, sonhando quem sabe, com seus amores, com sua casa, sua vida.

O bom humor, e a alegria de João contaminavam seus colegas, o seu assobio e seu cantarolar ao subir no andaime despertava a esperança fazendo os operários crerem nas possibilidades de uma subida nesta jornada da vida, por vezes tão árdua, de construtor e assalariado.

Com o dorso da mão João limpava o suor, que insistia em molhar a camisa marrom, indo cair sobre o coturno, que protegia seus pés ágeis. Sim, João sabia que tinha que ser ágil e muito cuidadoso, precisava preservar sua vida, para cuidar de outras vidas.

João olha suas mãos perfeitas, que lhe permitem, com maestria, preparar a massa do cimento. Olha essas mãos que nunca mexeram no alheio, nem precisaram bater nos filhos, meninos bons e educados. João faz estas constatações, olhando pro céu, sem entender, que Deus sabe que o seu sorriso é uma prova de gratidão.

Uma hora da tarde, João cochila debruçado sobre a jaqueta velha. Sonha com os seus valores, com seus amores, com tudo o que lhe faz sorrir. Talvez sonhe com a pipa azul, que Pedro não consegue empinar, com caminhão de plástico que Paulinho insiste em atolar na valeta junto à calçada, ou sonhe, quem sabe, com a cabeleira negra e cheirosa de Lena ....

A gritaria acorda João. O operário abre os olhos e se depara com os colegas, que eufóricos contam a novidade e lhe entregam um bloco de tickets para o almoço. Trêmulo João lê: Vale um Prato Feito!!!