O homem invisível

Às 7h30 ele chega para mais um dia estafante de trabalho. Tranca-se em sua sala e fecha-se em suas tarefas rotineiras. A certa altura do dia, ouve ao longe os queixumes de um sujeito reclamando do calor insuportável que fazia naquele dia. Com o seu ambiente de trabalho blindado pelo ar-condicionado, o executivo pensa, “bom, mais um motivo para eu não sair daqui”. E assim as horas passam, até que o luxuoso relógio de pulso, presente de seu avô paterno, indica o final do expediente.

Às 18h15 o homem já está no bar tomando uns drinques para relaxar. Wi-Fi funcionando perfeitamente, hora de ver o que os amigos estão falando no grupo do WhatsApp. Distraído, ele demora a perceber a presença de um aflito garçom tentando garantir a sua gorjeta.

São exatamente 19h50, quando nosso executivo finalmente volta para casa. A empregada, que já estava de saída, informa-o que sua esposa fora para a academia malhar. Quanto aos filhos, dois adolescentes cheios de disposição e com uma boa mesada para torrar, a mulher franzina apressa-se:

_ Não sei onde “os menino” foram não, seu Guilherme.

_ Tudo bem, Maria, pode ir.

_ Té logo então, seu Guilherme!

Sozinho novamente e encerrado em suas preocupações profissionais, por um instante não pôde conter um pensamento desdenhoso a respeito da esposa ausente. “Ora, não sei pra que tanto exercício; de que adianta um corpinho de vinte e oito quando o rostinho é de cinquenta e cinco”? “Preciso relaxar mais”.

O homem liga a tevê, localiza o conhecido canal por assinatura que exibe filmes pornôs e, tirando o pênis para fora, começa a “tocar uma” até gozar. Tudo muito rápido, como sempre fazia.

Às 20h45, Guilherme, o homem invisível por escolha própria, fecha-se em seu escritório doméstico e lá permanece trabalhando sem ser incomodado, até alta madrugada.

Muita droga estimulante, muito café e pouquíssima disposição para conversar. Essa é a vida de um homem que, ao contrário do que ele pensa, não fará muita diferença para o mundo quando a morte decidir levar. Ela espreita, quiçá, esperando que ocorra alguma mudança.