DESPEDIDA A UM AMIGO

Meu amigo me desculpe, mas não estarei presente em sua despedida. Isso seria muito para mim, com certeza eu não agüentaria de tristeza, ao ver você partir. É por isso que agora, nesse momento difícil, lhe escrevo essa carta.

Sei que deve estar pensando que traí a sua confiança, que lhe apunhalei pelas costas, “como ele pôde me abandonar assim, depois de tudo que passamos?”, deve estar se perguntando. Mas entenda que é necessário, é assim que as coisas são.

Quero lhe dizer que essa separação, também será difícil para mim. Afinal, fomos muito próximos nesses últimos dois anos e meio. Próximos mesmo. Íamos juntos para todos os lugares, festas, bares, faculdade... Todos os lugares.

Por isso meu fusca amigo, meu primeiro carro, digo que nunca te esquecerei.

Prometo que guardarei na memória, todos os quilômetros rodados e que não foram poucos. O barulho do seu motor roncando e assoviando a cada acelerada. O seu toca-cd, que pulava e parava de tocar a cada buraco passado, mas que enfim, era a trilha sonora de nossa amizade. Tudo isso, guardarei na lembrança.

Sei que lembrarei de você, sempre que ver na rua outro fusca, e é para aliviar essa dor e lhe homenagear, que deixarei um porta-retratos seu na cabeceira de minha cama, com aquela foto de nós dois sorrindo, em um dia de verão.

É verdade que sua pintura estava comprometida, que seu motor estava “engasgando” um pouco ao acelerar, que suas calotas precisavam ser trocadas, seu assoalho com um buraco de olho para rua se encontrava e outras coisas mais. Tudo isso é verdade. Mas prefiro me lembrar, dos momentos agradáveis que compartilhamos. E foram muitos.

Quantas meninas passaram em seus bancos, se aconchegando em seu interior compacto, mas acolhedor? Quantas risadas você presenciou, superlotado de seis ou sete amigos, onde só cabem quatro? Quantas vezes você foi meu companheiro, me ouvindo calado, desabafar sobre as “coisas” da vida? Ah, se você falasse, quanta coisa teria para dizer!

E por falar em bons momentos, lembra daquela vez que caiu um enorme temporal, alagando todas as ruas? Tenho certeza que sim. Vários carros modernos, potentes, cheios de “nove horas”, todos parados, com o pisca - alerta aceso e você, valente, rasgando as águas e deixando para trás todos eles. Você foi incrível dessa vez...

Juro, que tentei corresponder à sua fidelidade. Xinguei com os piores nomes, o motorista “barbeiro”, que avançando o sinal vermelho, colocou em risco, sua integridade física; te lavei, aspirei e encerei todos os finais de semana, mesmo se o tempo estivesse para chuva e me esforcei para pagar o seu conserto, sempre quando necessário (quase sempre era necessário).

Portanto meu companheiro, não fique magoado comigo e lembre-se, que apesar de meu novo carro ser mais potente, moderno e chamar mais a atenção, nunca te esquecerei.

Espero sinceramente, que um dia possa me perdoar, e torço para que encontre alguém legal, para continuar a sua caminhada. Como disse, não comparecerei à sua despedida, meu pai ou algum amigo cuidará disso, será menos doloroso para ambas as partes.

ADEUS.