Nos tempos do “Jornal do Povo” (1903)



 
            Para escrever essa crônica sobre a imprensa paraisense, retornemos à obra de José de Souza Soares, lançada em 1922, no contexto do centenário da Independência do Brasil e da edificação da primeira capela consagrada ao padroeiro da cidade. Trata-se da “Notícia Histórica de São Sebastião do Paraíso”, na qual o autor descreve atas da Câmara Municipal, entre outros temas. Após destacar o pioneirismo de “A Voz do Paraíso”, como primeiro jornal de Paraíso, o autor registrou que três anos depois, foi lançado o Jornal do Povo, em 19 de julho de 1903, propriedade da empresa Silva, Naves & Amaral, sendo diretor o capitão Manuel Venâncio da Silva.

            Dois anos depois, o mesmo semanário passou a ser de propriedade de Amaral & Amaral, não mais constando a existência de A Voz do Paraíso, conforme o Almanak Laemmert de 1906. Desde aqueles anos, uma prática comum para manter o jornal consistia em reproduzir matérias publicadas em outros jornais, geralmente para divulgar casos curiosos ou dosados com uma dose de humor. Nesse sentido, o Jornal do Povo, em edição de 1908, reproduziu um curioso edital publicado em outro jornal do interior brasileiro. Essa peça cômica merece ser transcrita. Trata-se de um delegado que publicou o “código de postura”, que os moradores deviam acatar, sob pena de serem punidos, com a devida aprovação da Câmara Municipal.

Faço saber ao povo da minha vara que a câmara aprovou e no próximo dia 4 sairei pelas ruas para cumprir as seguintes ordens. Vou aferir o peso de todo comerciante, bem como suas respectivas varas de medir. Ficam proibidos todos os tipos de rego na cidade. Aquele que tiver algum descoberto deverá tapar, bem como todos os buracos. Caso contrário será cobrado multa de 20 mil reis. Nenhum animal da ordem das cabras poderá roer na vizinhança. Toda pessoa que tiver seu bicho que o traga bem seguro, se andar solto, multa de 60 mil reis. Nenhum negociante ou taberneiro, mesmo que seja coronel da Guarda Nacional, não poderá vender farinha em cuia, o que é ladroeira. Nesse caso, a multa será de 5 mil reis. A todo indivíduo de raça canina, sem a coleira, será oferecida uma bola. Ainda mesmo que seja desses de cabelinho branco, criado por madame. É proibida a venda de leite com água ou de água com leite porque prejudica o negócio dos leiteiros honestos. Boi ou vaca deitado na rua sem lanternas nos chifres, de modo que os andantes a vejam bem de longe, multa de 5 mil reis. Cantadores de modinha desafinados, tarde da noite, na porta de botecos, cadeia até de manhã porque não quero esses desaforos nos meus distritos. Ninguém poderá andar armado, com armação alguma, nem de pau ou relho na mão porque isso é perigoso. Nesse caso, multa de 4 mil reis. Toda contravenção emitida nessa postura será resolvida por mim mesmo. E para constar e não dizerem depois que não sabiam, mando pregar esse edital na porta e na frente do boticário, lugar onde se fala da vida alheia. Assinado, fiscal geral Alonso de Pires Franco. A presente notícia foi publicada no Jornal do Povo, de São Sebastião do Paraíso, que por sua vez a reproduziu de outra folha da imprensa. [Gazeta de Queluz. Queluz de Minas, 10 de maio de 1908]

Alguns anos depois, José Aristheu de Castro exercia as funções de redator do “Jornal do Povo” e também de representante local do “Estado de São Paulo”. A importância do texto jornalístico como fonte para a redação da história está inserida nas mais amplas que caracterizam a fidedignidade entre a realidade do fato e conteúdo do texto. No caso do trabalho de jornalistas paraisenses correspondentes de jornais impressos em outras cidades do país tem uma importância histórica no sentido de preservar determinado ponto de vista sobre eventos locais ou regionais. Em certos casos, textos redigidos por esses jornalistas foram preservados e podem servir como fonte para compor a história. Isto não significa dizer que a notícia isolada expresse um fato histórico, mas a partir dos registros preservados é possível rastrear outras fontes.