24. Cordão Umbilical

Com a união violenta de minhas pulsões às minhas leituras, surgem frutos, de uma mente prenha, fecundada por pensadores de outrora, que a invadem, excitados, e a levam a um êxtase espiritual quase sexual.

E desses frutos somente eu partilho! Essa é talvez minha infelicidade (ou felicidade): a sensação de estar cercado, mas, ao mesmo tempo, estar sozinho num vasto deserto – não há com quem dialogar, ninguém se delicia dos figos de meu pomar.

E de que adiantaria se sentassem à mesa comigo? Nas parcas ocasiões em que tive companhia, ela logo foi rechaçada por olharem para cima e verem ainda meu umbigo – a carne de minhas crias pode ser dura demais para mentes pouco refinadas; o sangue de meus filhos pode ser amargo demais para mentes embotadas (de sangue doce e carne flácida faz-se modernos cristãos, que advogam serem meus irmãos).

Em verdade, o maior ato de agressão que sofro advém desses ordinários indivíduos. São eles que partem para cima de minha fértil solidão, com suas foices, iludidos, e arrancam meus frutos, ainda verdes, de seus galhos, para que nunca venham à existência findos – malbaratam minha riqueza.

Produzir ruídos, é esse o seu máximo ofício; desses seres. Ruídos afiados que penetram a minha mente e cortam o Cordão Umbilical que a conecta a suas crias... Que dom seria poder isolar meus ouvidos desse mundo condenado e aturdido!