27. Medo

Nos cumes do pensamento, uma melodia libertou do ódio meu espírito – e que brandura tomou seu lugar, doce brandura encharcada de lágrimas sutis.

Aqui, do alto desse morro, onde os ventos do porvir se convergem, cessei de fitar o futuro e voltei meus olhos para os que estão abaixo, no vale; todos eles sofrem... Confusos, perdidos, tais como eu, sofrem de todas as obras da realidade – e que obras.

Veja aquela garota de cabelos longos: esconde todo seu medo por detrás de um sorriso brando; ela treme por dentro, todas as manhãs, e acredita que o melhor remédio para o medo seja a gentileza, a delicadeza no trato com o próximo.

Observe aquele homem: tão medroso quanto, mas, esmagado pelas cobranças do mundo, disfarça todo seu pavor com a máscara do ódio. Olha para si, logo cedo, e reconhece desejos de sua carne que julga doentios – ataca quem deles partilha, cultiva preconceitos, o antípoda de Gerda.

A humanidade teme – algo! Mas o quê? Teme a si mesma? A Morte? O Destino? O Tempo? Tudo isso? E que diferença faz apontar o dedo para os monstros certos? No fim, tudo que resta é o medo, Monstro Maior, que assume tantas formas, tão diversas; aprisiona corações e os flagela até sangrarem.

Dessa dor, multiplica-se o medo.

E do medo, mais dor.

Da dor, brota o aprendizado.

E do aprendizado, mais temor.

E de tudo isso resulta a – humanidade.