Aprendendo sobre a vida

Era tarde da noite. O trem seguia numa velocidade um pouco acima do comum. O cansaço fazia-se notar na grande maioria das feições. Vida nossa de cada dia!

Depois de um dia de trabalho o que a maioria queria era descanso. Alguns ainda trabalhavam durante a viagem – olha a água! Alguns procuravam um modo de preencher o tempo da viagem: uns mexiam no celular, outros liam, outros se contentavam em perceber a paisagem. E assim o trem continuava...

Das muitas histórias de vida carregadas por aquele trem, uma me chamou a atenção. Um jovem haitiano, chamado Paul, estava ali vendendo chocolates para ajudar a custear sua faculdade. Com muita dificuldade no uso do português, ele se esforçava para fazer-se entender pelas e pessoas e agradecida efusivamente quando alguém o ajudava.

Paul deixou o seu país em busca de uma vida melhor. Cursa engenharia civil e pretende ajudar seus conterrâneos com os conteúdos e práticas assimilados em seus estudos. As férias ele aproveita para ir à capital e conseguir alguma ajuda para seus estudos e outras necessidades básicas.

Quando finalmente me aproximei dele, quis parabeniza-lo por sua coragem e pela bela iniciativa. Ele me olhou e disse: “Sou muito grato ao Brasil. Sempre ouvi que esse país era uma mãe que acolhia todos os seus filhos. Hoje sei bem o que isso significa”. Concordei com ele, evidentemente. Seus olhos falavam de alegria, esperança e gratidão.

Contou-me um pouco de sua história, sua chegada ao Brasil e sua persistência em buscar algo melhor para sua vida. Diante de tantas palavras carregadas de sentido, procurei conter minha emoção. Ele tinha a simplicidade de uma criança e a convicção de alguém muito experimentado.

Naquela noite aprendi muito com o Paul. Ele me falou de tantas coisas... O mais impactante, no entanto, ele disse no final. O trem se aproximava da última estação – estação da qual ele não conseguia pronunciar o nome – e falei para ele do prazer em tê-lo encontrado. Ele me olhou e disse: “Meu irmão, a vida por mais dura que seja vale a pena ser vivida”! Lembrei-me imediatamente da “vida Severina” tão bem descrita por meu ilustre conterrâneo João Cabral. Vale a pena viver!

Em dias difíceis – quando matam um homem, com requintes de crueldade, no dia Natal por defender a vida de travestis ameaçados – como os que vivemos, pus-me a refletir sobre aquela frase. Vinda daquele jovem tão cheio de vida e ideais, encheu-me de ânimo. Não podemos desistir do ser humano! Vale a pena viver!