Fragmentos de um Carnaval.... kenny dy

Fragmentos de um Carnaval.... kenny dy

A dor paralisava minha perna, os médicos não aguentavam mais, já maquinavam como iam me dar alta. Nesse momento não sei se essa foi uma história ou estória, pelos efeitos do coma alcoólico ou das grandes quantidades de medicamentos que tomei no hospital.

Mais uma dose de medicamentos, a dor gritava de todos os lados do corpo- hei cowboy, tua aventura acabou eu sou tua companheira agora, não reparou, fiquei só eu e vc! Em outros tempos, vivia uma vida dupla, mas agora percebo que fui o anti - herói da escória.

No castelo, “o rei”, sempre desonrado, apesar de vencedor das guerras, em casa, esperava a batalha mais difícil que nunca era vencida: a esposa não me amava e os filhos sentiam desprezo por mim. Mais uma vez Carnaval, eu iria me atrasar pro meu aniversário, desliguei meu celular e acelerei a moto e fiz uhuhuhuhuhuhuh!

No delírio da “magrela”, um sussurro quente ao ouvido, da loira do último bloco de carnaval, seus braços em minha cintura e a cabeça sob meu ombro, regados a cinco dias de muita bebida e drogas, agora o desfecho era o motel, porém ele não iria acontecer, pois as forças da natureza conspiravam contra mim.

Os medicamentos se multiplicavam sobre a mesinha, sorri com receio para o sol que forçava os seus raios em minha direção. Não era para tanto, fora de mim, coloquei meus sentimentos no prontuário, não era para a morte, mas escrevi meu testamento enquanto as horas passavam até a mudança de plantão.

Os olhos se fecham relembrando o primeiro flerte com a enfermeira. Ela de semblante gentil, de escultura grega que saltava aos olhos o seu busto, de um loiro que balança reluzindo as madeixas, falou em minha direção palavras tão doces: vire-se está na hora de tomar a injeção, não resisti a tentação daquele “anjo”, que nunca me faria mal, mas, confesso: doeu na alma!

Interrompido esse momento mágico: - Tenho boas novas.... - era o médico que vinha me dar alta. Antes que concluísse fitou-me com olhar de censura, implorei até deixar que as lembranças da noite anterior temperassem meu semblante, desconcertei as palavras e finalizei com a voz sumindo: por favor, me deixa ficar só esta noite, tenho medo de voltar ao meu mundo, não me lembro de nada.

Por um instante me perguntei o que acontecera na noite anterior? Que lembranças de coisa alguma; que fim teve a loira do último bloco que estava comigo na moto? O que aconteceu comigo, não há lembranças só muita confusão na minha cabeça. Surge com insight e desespero as respostas às minhas perguntas: aprofundei uma grande tristeza, e perguntei de novo a mim mesmo – por que eu fiz tudo isso?

Os restos do meu vestido, ainda denunciavam o sangue colado à base de confete, brilho e serpentina. Lembrei: não consegui desengatar o sitiem da minha fantasia do volante da moto, perdi o controle e pra mim acabou aquele carnaval: bati na ambulância, morreram o motorista, o enfermeiro e o paciente da ambulância, só eu escapei, e se vc perguntar pela loira, ela voou literalmente com a colisão e explodiu sua cabeça na sarjeta.

Preferia que tivessem virado essa página, rasgado o livro, ateado fogo e jogado as cinzas em qualquer abismo para que ninguém soubesse dessa história, porém o boletim de ocorrência existe e lavrou a fatalidade. Ouço a sirene da ambulância, ainda a tocar em minha cabeça como naquela noite, será que se esqueceu de parar de tocar?

Ouço a voz do agente de polícia, junto ao meu leito a perguntar pelo meu nome, não respondi. Ele conferiu o prontuário e confirmou com o médico, leu meus direitos e me deu voz de prisão pelos crimes cometidos. Logo entenderia que aquela sirene era o sinal que realmente aquele Carnaval havia acabado comigo.