Alucinação dos Quarenta.

Pronto, quarenta anos!

Lá fora o céu azul de abril quase que chama os homens para o voo diário ao infinito.

Mas não podem, quão ocupados estão em seus afazeres de trabalhadores civilizados.

Cancioneiros, deputados, marqueteiros e todos os donos, senhores e servidores públicos carregam consigo a inexorável aptidão ao poder de baterem seus carimbos a fim de manterem a subsistência como provedoras da vida dos outros, meses, anos, salários. Dominam e se deixam dominar num tempo onde comprar coisas, casas, financiadas ou não, enquanto suas crianças rumam a escolas em que ‘mestres’ do além, enchem cérebros de concreto, sangue e suor.

Naquele tempo onde tudo transcorria como a vida comum num vacante planeta do sistema solar, na tragicomédia em que a honestidade não passava de um resquício de matéria bruta sobrevoando o sistema aquisitivo de direito.

Diante tantos dilemas e problemas que não param e nem podem parar, eis a vida e seus opostos morte e sorte, meus irmãos, acreditem ou não, é velha jogatina.

Ser feliz ou triste, não importa. Passado o tempo em que nos preocupávamos com essas coisas.

A preocupação, agora, tem prazo de validade.

O hoje é mais importante que o ontem e o amanhã!

Aquelas nauseabundas digressões sobre o tempo perderam o sentido. Acredite ou deixe o esvair escorrer entre suas entranhas.

A tentativa é um bálsamo recursal que a vida nos proporcionada a cada acordar. Tente sempre!

No mesmo diapasão, jamais morra ou mate, a não ser que se depare frente a frente com político corrupto no corredor de um botequim na alta madrugada.

Tenha paz no coração, irmão.

Compre sua porção de processados e embutidos mesmo no auge da crise da carne podre.

Depois dos quarenta, olhar no espelho pela manhã é um ato de bravura. Aqueles cabelos que tanto incomodava na puberdade agora são escassos, fiapos brancos dependurados numa abóbora madura.

A bravura do indomável dará lugar à cautela do ser que temia solidão e dor, mesmo ciente da imaginação.

De tudo que podia fazer, não viverás nada daquilo de quem escreveu sua carta de despedida.

Tentou ser mergulhador, o sortudo do jogo, feliz nas profecias e no amor. O que é isso?

Uma das poucas conclusões é a famigerada sorte por estar vivo e comendo processados e embutidos, enrustido no imbróglio existencial.

Se quase não dorme, meu, e daí?

Às vezes sente a impressão que tudo não passa de um grande teste de resistência, onde temos de ser fortes como Nietzsche ou morrermos baleados num fusca como Marighela, ou sentados numa cadeira de balanço como revolucionários portando a anciã ânsia de um velho barbudo acomodados na cadeira dos balanços gerais de um passado de derrotas, idas e voltas tristes de quem se cansou de tentar em vão.

Às vezes tentamos projetar em nós a falha do mundo e no mundo o que faltou em sua herança genética, e só vemos um vazio enorme como a muralha da China, e, diante toda essa parafernália, aumentamos o volume do som e ingerimos com mais voracidade a cerveja morna que compõe nossa ínfima experiência. Tudo é um grito surdo no absurdo do tempo.

Na maior parte das vezes tentamos encontrar palavras que descrevas nossas angústias. Tentamos ser nós mesmos e o que os outros querem ou acham o que é suficiente. Estatuetas Incas quebradas e coladas com super-bonder. Nunca mais encontraremos aquela presenteada pelo saudoso tio que nos deixara aos trinta e três!

As coisas vão se dissolvendo com o tempo enquanto os que ficam vão se encarregando do processo de aceleração.

As plantas que nascem e crescem no concreto são exemplos de vida. Estão ali, nasceram ali e sabem que dali dificilmente sairão, a não ser que algum animal as arranque com a mão ou com os dentes. São apreciadoras máximas desta coisa aclamada existência.

Mesmo inertes e concretadas em seu derredor, vislumbram a vida em resistência pacífica.

Conhecem suas limitações.

Plantadas neste mundo e nesta vida, sentem o vento e o sol, solamente, a contento. Não lhes foram dadas a opção ‘querer’.

No mais, my best friend, hoje só quero ficar com minha filha e tentar dizer a ela algo construtivo, como o quanto a amo.

SAvok OnAitsirk

31/03/17

Cristiano Covas
Enviado por Cristiano Covas em 31/03/2017
Código do texto: T5957304
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